Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Araçatuba-SP
Fiquei à espera do desfecho da narrativa de "catadores de papel da Acrepom" terem encontrado num cofre, deixado como sucata pela própria polícia na sede da ONG, a importância de R$ 36 mil num fundo falso.
Essa espera é para não tirar conclusões apressadas. Afinal, o cronista não pode fazer conjecturas numa história tão bonita. Pensei: "Vamos ver se vai ser bonita mesmo". E foi. Os catadores não esconderam o dinheiro para si num mocó, pois sabem que dinheiro é vendaval, por isso levaram-no para a diretoria da Acrepom na maior transparência (Associação dos Catadores de Papel, Papelão e Materiais Recicláveis de Araçatuba).
Eu já havia ouvido narrativa semelhante de que um negociante de móveis usados, coloniais, por exemplo, ao comprar um lote de peças de gente fina recebeu também um cofre. Tiveram que arrebentá-lo para ver o seu interior.
E não é que havia uma fortuna! Parece que ninguém procurou o dono do cofre ou seus herdeiros, esconderam no mocó. Os negociantes eram "gente do bem", mas não tiveram nenhum pudor em ficar com a riqueza. Ao contrário dos "catadores de papel" da Acrepom, calaram-se.
A honestidade dos "catadores de papel" fez as pessoas pensarem no eufemismo, chamando-os de "cuidadores do meio ambiente", gente que vive limpando a cidade sem receber salário.
Assim diziam na cidade que a fortuna do comerciante brotara do chão como tiririca. Como foi num tempo antigo, nem se pode dizer que o golpe era lavagem de dinheiro.
O tal cofre da Acrepom tinha sido objeto de roubo no município de Auriflama em 2018 e havia ficado na delegacia. Nele havia R$ 167 mil, que foram roubados. Até que os policiais resolveram doar o cofre para a ONG. Ninguém teve a curiosidade de vasculhar o compartimento secreto do cofre, como fizeram os catadores que acharam um fundo falso com R$ 36 mil.
A pessoa idosa, dona verdadeira do cofre, procurou a polícia para se dizer dona. E a chave que ele tinha do cofre ainda servia na fechadura. A justificativa do idoso era que mantinha a grana em casa porque não sabia mexer em caixa eletrônico.
Eu sou bem-sucedido para achar minhas coisas perdidas, sem mesmo dar três pulinhos para São Longuinho. Já encontrei minha carteira perdida em terminal de ônibus em São Paulo e meu celular largado no banheiro do Supermercado Rondon.
Nesta semana, depois de procurar uma tesourinha da Helena que havia caído na greta da cadeira do papai. Com a busca, achei também dois chaveiros desaparecidos, que mereceram muitos xingamentos, uma caneta tinteiro e um lápis. Foi uma farra o reencontro.
Temos essa mania de ter e de nada perder, quando alguém desaparece de nossa vida, ficamos desesperados, como se as pessoas fossem objetos. Os falecidos desaparecem mesmo, só ficam trancados no cofre de nosso coração.
4 comentários:
Adorei...😊
Crônica muito boa. Gostei.
ahhh essa "gente do bem"....
👏👏👏👏👏👏 Gratidão... Muito bom..
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