AGENDA CULTURAL

2.2.21

Por que tantas lives e espetáculos pela internet?

Exemplo de live de artistas de Araçatuba

Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Araçatuba-SP


Em nossa civilização, está embutida na sua memória a fábula da cigarra e da formiga. Esta é trabalhadora, previdente, veio ao mundo a trabalho. A outra canta o tempo todo, não pensa no futuro, veio ao mundo a passeio. Ela representa os artistas. 

Então, quando se fala em artista entre nós, pensa-se em gente folgada, vagabundo e outros xingamentos. Ninguém gosta de ajudar artistas, a não ser jogar uma moeda no chapéu do cego sanfoneiro.

Nós, humanos, não vivemos sem arte. Ou produzimos arte ou a consumimos. Música sertaneja é arte, pagode, rap, samba, pintura, dança, literatura, dança, teatro, arquitetura. Como a gente gasta dinheiro com alimentação do corpo, precisamos nos divertir, sair do estresse, pensar na vida com mais profundidade. Essa busca da excelência da vida tem um custo financeiro numa sociedade baseada no mercado.

Gastamos dinheiro com a arte, às vezes, sem saber. Assinando a Netflix, fazendo assinatura do Spotify, fotografando com o celular, escrevemos poemas no blog.  

A pandemia desequilibrou tudo, causou desconforto em muita gente, principalmente no meio artístico. Como a criatividade surge do tamanho do problema, surgiram as lives. Como dizem os pobres, Deus manda o frio conforme o cobertor. 

As primeiras lives eram feitas por artistas amadores, como uma forma de preencher o tempo, depois entraram os profissionais, ganharam sofisticação, a filantropia se associou, muito patrocínio. Deu para os artistas, principalmente os músicos, ganharem algum trocado. 

Até que parlamentares, no elã da votação do auxílio emergencial, no Congresso Nacional, fizeram uma lei especial para socorrer os artistas. Houve resmungo de Paulo Gudes, xingamentos de Bolsonaro, mas saiu. 

Não estou falando dos famosos, mas daquelas pessoas que fazem da arte um meio de vida, que "trabalham para comer". O palhaço, bailarinos de academias, o músico de barzinho, a artesã, contadora de história, trapezistas, os profissionais que montam palco para os espetáculos (técnicos de som, iluminadores). E todos foram fazer projetos de arte para ser apresentados pela internet. Defender o prato do dia.

Um amigo me perguntou: Facebook, Instagram e YouTube cobram para hospedar livres? Respondi que não. Aí ele socou outra pergunta: por que o governo precisa ajudar os artistas para que façam lives?

Primeiro: os artistas precisam sobreviver, sem aglomerar, não fazem espetáculos; com a pandemia, perderam o ganha-pão. Segundo: a montagem da live tem um custo. E fiz uma piada: "Livre é como horário político na televisão. A TV não cobra nada, é gratuito, mas montar o programa político precisa de investimento". Assim são a produção das lives.

Além disso, a população precisa se divertir, ver algo alternativo, não ficar em casa só com televisão comercial, jogo de futebol e novela. Precisa de um isolamento mais inteligente. Cada cidade deve curtir seus artistas locais, por isso o poder público faz editais para que os artistas montem espetáculos virtuais. 

Houve prefeituras que ignoraram a Lei Aldir Blanc, aliás nem têm secretaria de cultura em seu município. Felizmente isso não aconteceu em Araçatuba, onde há uma classe artística renhida, exigente, e um prefeito municipal ao clamor de seu povo. A internet está cheia de lives de Araçatuba. Até este cronista vai mediar oficinas literárias.      

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