AGENDA CULTURAL

5.9.23

Independência ou morte


JAGUAR, “Eu quero mocotó”. In: Pasquim, ano II, n°72, nov.1970    

Hélio Consolaro é professor, jornalista, escritor. Araçatuba-SP

Antigamente, bem antigamente, não havia pátria e nem nação, havia reinos e impérios, todos organizados em torno do suserano, por bem ou por mal. Não havia leis, obedeciam-se  apenas a vontade do rei.

As poucas cidades existentes eram cercadas, verdadeiras fortalezas. E o rei lá dentro, protegido. Expandir território era a ambição dos poderosos.

O Brasil era uma colônia de Portugal, não tinha governo próprio. Com a ameaça de Napoleão Bonaparte, Dom João VI, correu de medo para o Rio de Janeiro, transferindo a sede do reinado.

A ameaça na Europa havia sido aliviada, os portugueses pediam  a volta Dom João VI, assim ocorreu, em 1821, deixando aqui o filho Dom Pedro, que não queria ficar, mas houve o Dia do Fico, 9 de janeiro de 1822. "Fica no Brasil,  Dom Pedro!". E ele ficou. Daí Araçatuba ter a Rua do Fico, no bairro Santana.

A elite brasileira, acostumada a ser sede de governo, não gostou de ser rebaixada novamente a colônia. Então começou o movimento de independência, querendo que Dom Pedro fosse o primeiro rei           (imperador). Ele era português, não ia trair o pai, então Dom João VI teve uma conversa de pé de orelha com o filho: “Tome a coroa, antes que algum aventureiro lance mão dela”. A pátria brasileira surgiu de um conchavo.

Não havia fotógrafo na época, muito menos celular, apenas carruagem. O quadro "Independência ou morte", de Pedro Américo foi encomendado mais de 60 anos depois, em 1888, para decorar o Museu do Ipiranga. Quando o grito foi proclamado, o artista não era nem nascido.

Pedro Américo vivia em Florença, na Itália, quando pintou o quadro, fez uma pesquisa para resgatar informações da época.

Na realidade, fora da tela, a cena foi assim: o príncipe regente abatido em cima de uma mula, vestindo roupas simples, acompanhado de poucas pessoas. Dom Pedro estava com disenteria. Não havia cavalos de raça porque a região exigia a força de animais mais fortes.

A comitiva tinha catorze pessoas. Os guardas não estariam usando uma farda tão pomposa. Os Dragões da Independência (batalhão existente em Brasília) só adotaram o uniforme representado na pintura mais de cem anos depois, em 1926.

O próprio Pedro Américo deu uma explicação sobre a produção em que revela a intenção de mostrar a independência como algo heroico.  Nas palavras de Pedro Américo: “A realidade inspira, e não escraviza o pintor.” O artista  esforçou para ser sincero na reprodução do fato sem esquecer as beleza da arte.

Numa edição do jornal Pasquim, crítico à ditadura militar, em 1970, o cartunista Jaguar (ele insiste que o desenho foi do Henfil, apenas levou a culpa), diante do sucesso da música "Eu quero mocotó", fez a sátira sobre o fato, usando o quadro de Pedro  Américo. Jaguar ficou preso por dois anos por causa do balão.

Nesta semana, diante do feriadão, nem nos lembramos muito bem o motivo de tamanha folga. Este cronista vem lembrar que todo feriado foi precedido de coragem e luta.


 

Um comentário:

Ventura Picasso disse...

A desenterra de Pedro gerou o Bolsonaro...