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Reproduzir órgãos com um tipo celular ou material deve ser menos complexo, do que com muitos tipos celulares e materiais |
Quando o órgão que se quer obter em laboratório ou em vivos,
é formado por vários tipos celulares, fica mais difícil ter sucesso. O fato
de ter vários tipos de células, de origens diferentes entre si, torna mais
complexo concatenar as funções de uma com a outra.
Para formar um dente, o corpo tem que formar a dentina que
dá a maior parte da estrutura e forma ao dente. Quem forma a dentina, são as
células chamadas odontoblastos no centro do dente, na estrutura chamada polpa
ou o “nervo”.
Por cima da dentina, tem que formar o incrivelmente duro
esmalte, que vai ficar exposto na boca, moldando e escondendo a dentina abaixo.
Na raiz, a dentina é revestida por cemento, outro tecido duro. Um dente tem
TRÊS tecidos duros depositados e mineralizados lentamente para ficarem
cristalizados e aguentar a mastigação. Haja resistência.
Os dentes são formados por células que se originam em
lugares diferentes no embrião e feto. São SETE populações de origens
diferentes, como se fossem pessoas de sete países diferentes, que tem se
conjugarem harmoniosamente para formar o dente. Na superfície da raiz, ainda
tem o ligamento periodontal e o osso fasciculado, também formados por outras
populações diferentes.
Imagine uma escultura humana de bronze. A cabeça seria
cerâmica, o corpo de bronze e os membros de borracha. Isto sem contar que por
dentro teria que ter um tecido esponjoso para nutrir todos. O escultor ia ficar
maluco de tanto trabalhar (Na foto, escultura de dente “Comprehension” de J.
Seward Johnson).
Para formar dentina, as células chamadas odontoblastos, têm
que combinarem com as que produzem o esmalte, chamadas ameloblastos. Para
produzir o esmalte, elas têm que combinar, o tempo o local, com as que produzem
a dentina. A mesma coisa acontece com as células ao formar o cemento na raiz,
chamadas de cementoblastos, concatenando o tempo e local com a formação da
dentina, osso e ligamento periodontal. É mais “fácil” fazer um coração, do que
um dente: isto é incrível!
QUEM INVENTOU?
Por isto a “notícia” que circulou na internet leiga, de que
pesquisadores japoneses descobriram uma substância que ao tomar, injetar na
veia ou passar na mucosa, faria os dentes nascerem de novo, tem que ser vista
com muito cuidado. Primeiro cuidado é que os dentes “vão nascer de novo”. Como
assim? Impossível, se caíram e foram embora, como vão ressuscitar os dentes
extraídos? Onde estão estes dentes para “nascer de novo”? Ou serão que irão
reencarnar os dentes! De onde viriam estes dentes?
Cada dente é como fosse um embrião e feto à parte, de tão
complexo que é a odontogênese, ou processo de formação de um dente. Um
medicamento não consegue ligar e desligar genes para a formação de dentes. Não
existe um gene para a formação de dentes: são vários! Não existe um mediador
para formar o dente, são vários. Ou seja, não é tão simples a ponto de ir à
farmácia, pedir o remédio para passar na boca e os dentes “nascerem” de novo.
O fato é: pesquisadores analisaram genes e mediadores em
animais para interferir na ausência congênita de dentes. É um trabalho
experimental na Universidade de Kyoto, publicado na “Scientific Reports” em
2021, uma revista de “acesso aberto” do grupo Nature. Daí, extrapolar para o
uso clínico breve na população, inclusive em desdentados, é uma viagem de longa
duração. Os cientistas não publicaram que os dentes iriam “nascer de novo”, mas
escreveram que “nossos achados têm implicações no desenvolvimento de tratamentos
tópicos para a agenesia congênita de dentes.” Que loucura!
REFLEXÃO FINAL
A “notícia” publicada na “internet leiga”, não tem base científica. A impressão é que soltaram esta “notícia” para conseguir audiência e financiamentos, mas não precisava usar tanto assim a imaginação! E pior, é que tem gente que acredita!
Professor Titular da USP
FOB de Bauru
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