AGENDA CULTURAL

20.3.16

Recém-nascido abandonado (A roda dos enjeitados)

Cabo Fabiano Sônego Bodo

Um bebê com aproximadamente duas horas de vida foi encontrado abandonado em frente a uma residência no bairro Dona Amélia, em Araçatuba, na tarde desta quarta-feira (16/3/2016).

Essa notícia me fez lembrar de um bate-papo com outro idoso, porque conversar nessa idade é um passatempo maravilhoso. O assunto não era mãe e nem criança abandonada.

De repente meu companheiro de prosa, soltou um xingamento:

–Minha mãe, aquela cretina. Como a odeio!
A sacola em que foi deixada a criança

Parecia um adolescente falando de sua mãe. Não. Não era, era voz de um velhinho.

–Mas qual motivo de tal revolta, companheiro? – Perguntei-lhe.

–Fui abandonado por ela. Nunca a vi. Não sei quem é e nem vou saber. Se estou velho, ela já morreu. Carrego isso comigo.

–Mas você não foi abandonado pela humanidade e nem por Deus, é bem de vida, com diploma universitário... 

Antigamente, bem antigamente, não havia criança abandonada, nem Conselho Tutelar, muito menos se falava em política pública para a proteção de nossas crianças.
Roda dos enjeitados - onde eram abandonados os recém-nascidos

Como havia muita criança “enjeitada”, esse era o nome usado na época, assim a Igreja Católica institui a “Roda dos enjeitados” nos orfanatos, onde a mãe punha o filho que não podia criar.
“Elas eram instaladas nos muros das Casas de Misericórdia e conventos para o recebimento de recém-nascidos abandonados. 

Após a criança ser colocada numa porta giratória, a pessoa que estava entregando o bebê girava a roda e puxava uma corda com um sino para avisar que uma criança acabara de ser abandonada.”
Não era uma atitude muito certinha, mas melhor do que deixar a criança ao relento, à beira da sarjeta, como aconteceu na notícia da epígrafe.

Todos nós condenamos a mãe e nem nos lembramos que a criança abandonada tem um pai que apenas semeia. Na condição biológica de fêmea, a mãe cuida da roça, mas aos poucos estamos nos tornando mais responsáveis.

Ana Paula Binacci Leite Santana

O recém-nascido no Jardim Dona Amélia, Araçatuba, mas podia ser em qualquer cidade, não teve nem a roda dos enjeitados, mas encontrou Ana Paula Binacci Leite Santana que, como um anjo, anunciou o seu nascimento à sociedade araçatubense e os braços amigos do cabo Fabiano Sônego Bodo. Muitas famílias querem adotar o menino  encontrou muitas famílias querendo adotá-lo. Não estamos comemorando o Natal, mas a Páscoa que será no próximo domingo.

Meu amigo velhinho, revoltado, seus pais naturais lhe transmitiram uma boa saúde hereditariamente, pois tem quase 80 anos, mas seus pais verdadeiros são os que criaram você. Você não está na idade de ter mágoa e ódio em seu coração, a velhice é a idade propícia para o perdão. Feliz Páscoa, meu velho, ressuscite!


*Hélio Consolaro é professor, jornalista, escritor. Secretário municipal de Cultura de Araçatuba-SP

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