AGENDA CULTURAL

29.10.16

Nem tudo que é cultura brilha

Hélio Consolaro*

Eu podia deixar este assunto de lado, mas um cronista não pode se omitir diante de assunto tão importante. A indignação se completou recentemente, quando não sou mais secretário municipal de Cultural. Agora, posso escrever.

Em maio de 2013, o proponente de “Liberdade Sempre – Exposição Multimídia e Amostra de Documentários”, professor Euclides Garcia Paes de Almeida, aprovado pelo Fundo Municipal de Apoio à Cultura de Araçatuba, promoveu na Biblioteca Municipal Rubens do Amaral a primeira apresentação de seu sonhado projeto, ajudado por Marcos Ianner. Não fazia parte da proposta ter um festival de filmes no teatro municipal Paulo Alcides Jorge, mas quiseram enriquecer a exposição.

Naquela época, estava sendo lançado o documentário "O Dia que Durou 21 Anos", sobre a Ditadura Militar, direção de Camilo Tavares, da Pequi Filmes, coprodução da TV Brasil (pública) e com verbas do incentivo fiscal. Era o mesmo tema do projeto de Araçatuba.

E assim a Folha da Região, jornal de Araçatuba, noticiou a programação da exposição, que foi reproduzido no seu site. E a tal de Pequi Filmes viu que o filme estava incluso numa programação de evento público em Araçatuba pela internet.


Uma foz feminina que se dizia representante da Pequi Filmes me telefonou dizendo cobras e largartos, me distratando, aos gritos, dizendo que ia processar a Prefeitura de Araçatuba, porque geralmente prefeitura tem muito dinheiro para pagar indenização por crime de pirataria.

Chamei o professor Euclides, pedi que suspendesse a apresentação de todos os filmes, já que eles não constavam do projeto. A minha determinação foi acatada.

Professor Euclides, inocentemente, disse que pensou não haver problemas, pois quem produziu o filme era um pessoal da esquerda.
Eu lhe respondi:

- Há gente da esquerda que gosta mais de dinheiro do que capitalista, meu amigo!


Marcos Ianner, com todo cuidado, me disse que a TV Brasil havia disponibilizado o documentário no YouTube, de onde ele puxou a cópia. Entramos no site, havia no lugar uma nota que ele havia sido retirado.

Como secretário municipal de Cultura da época, mandei um ofício para uma pessoa chamada “Karla Ladeia”, conforme me foi indicado, dizendo que o filme não ia ser apresentado. E o assunto foi encerrado.

Embora eu tenha sido vítima da Ditadura Militar, processado e absolvido, nem quis ver o documentário depois da grosseria da Pequi Filmes. Até então, eu não sabia que havia dinheiro público na produção do documentário.
 
Professor Euclides recebe alunos na exposição de seu projeto na biblioteca municipal Rubens do Amaral
Ontem, 28/10/2016, liguei a TV no canal Curta, porque lá sempre há uma excelente programação histórico-cultural, quando ia iniciar o documentário. E vi nos créditos todos os órgãos públicos financiadores do filme.  

Por que estou escrevendo isso? Para engrossar a denúncia de que há muito espetáculo (não em Araçatuba) financiado pelo poder público que a população paga, e caro, para vê-lo depois de pronto, como aconteceu, por exemplo, com Circo Soleil no Brasil.

A pessoa da Pequi Filmes que me tratou mal, espero que não seja a Karla Ladeia, sabia que o documentário havia sido financiado pelo governo e que seria apresentado por um projeto financiado por um fundo público. A conversa podia ter sido diferente, mas houve falta de compromisso com o dinheiro público.
É assim que os projetos culturais andam perdendo o crédito.

*Hélio Consolaro, professor, jornalista e escritor. Membro da Academia Araçatubense de Letras.

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