(Considerei o artigo muito bom e oportuno, por isso a publicação neste blog.)
Estou cada vez mais convencido que alguns conceitos que vêm
da neurociência, incluindo claro os da moderna psicologia, devem ser
transmitidos ao público. Estamos constantemente fazendo escolhas e existem
interesses para que escolhamos desta ou outra forma, desde o sabonete no
supermercado ao político nas urnas. Agências de publicidade usam as ferramentas
que vêm da psicologia social e cognitiva para fazer nossa cabeça, e o fazem de
uma forma que não somos capazes sequer de imaginar.
Uma dessas ferramentas de manipulação é o efeito de
enquadramento interpretativo (framing). Tendemos a escolher entre uma ou outra
possibilidade não pelo conhecimento de cada uma delas e sim pela forma como
essa possibilidade é apresentada. O exemplo mais conhecido é o Problema da
Doença Asiática, proposto por Tversky e Kahneman em 1981.
No experimento (social) os participantes foram convidados a
imaginar que os EUA estão se preparando para o surto de uma doença asiática
rara, que matará 600 pessoas. Dois programas alternativos para combater a
doença são propostos. Para um grupo de participantes foi solicitado que escolhesse
entre os programas A ou B. Das 600 pessoas que iriam morrer, o programa A
salvaria 200. Já com o programa B haveria 1/3 de probabilidade de que as 600
pessoas fossem salvas, e 2/3 de probabilidade de que nenhuma fosse salva. 72%
dos participantes optaram pelo Programa A e 28% pelo programa B.
Para um segundo grupo de participantes foram apresentados os
programas C e D. Adotando o programa C, das 600 pessoas 400 iriam morrer, já
com o programa D haveria 1/3 de probabilidade de ninguém morrer e 2/3 de
probabilidade de que as 600 pessoas morressem. Neste caso, 78% dos
participantes preferiram o programa D e 22% o programa C.
O leitor atento terá percebido que os programas A e C são
iguais (e envolvem certezas), e o mesmo acontece com B e D (envolvendo risco),
mesmo assim houve uma clara inversão de preferências por parte dos
participantes. Por quê? De acordo com os autores, o cérebro fixa sua atenção em
palavras com impacto emocional como “salvar” ou “morrer”. Se a palavra “salvar”
aparece, os participantes optam rapidamente pela ação que tem menos risco
(associado à palavra “probabilidade”). Se a palavra “morrer” aparece, os
participantes preferem arriscar. Poucos pararam para analisar o conteúdo dos
programas. Esta constatação tem uma enorme importância no mundo dos negócios e
investimentos. Não à toa Kahneman foi laureado com o Nobel de Economia por seus
estudos.
Mas o que tem a ver com política e eleições? Tudo. Os mesmos
mecanismos de framing são utilizados pelos meios de comunicação para favorecer
este ou aquele candidato. Jornalões, jornais televisivos de horário nobre,
etc., não apenas estabelecem a agenda de temas de debate público, mas também
são capazes, utilizando mecanismos como os demonstrados no problema da doença
asiática, de favorecer uma determina interpretação dos fatos.
Temos que ficar atentos. Somos bombardeados por esse e
outros mecanismos de manipulação todo dia. Vi assalariado comemorando a “PEC do
teto”. Vejam como o framing é poderoso!
* ROELF J. CRUZ RIZZOLO
Cirurgião-Dentista pela Faculdade de Odontologia de Bauru,
USP.
Mestre em Ciências (Morfologia e Biologia celular) pela
Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, USP.
Doutor em Medicina e Cirurgia (Neurociências) pela Facultad
de Medicina de la Universidad Autónoma de Madrid (Espanha).
Livre Docente em Anatomia Humana pela Faculdade de
Odontologia do Campus de Araçatuba, Unesp.
Professor Adjunto da Faculdade de Odontologia do Campus de
Araçatuba, Unesp.
Leciona Anatomia humana.
Pesquisas científicas na área de Neurociência (anatomia
química do córtex cerebral normal e em modelos experimentais de desnutrição
proteica e anóxia neonatal).
Autor de livros didáticos na área de Anatomia Humana.
Criador de Sites de divulgação anatômica para alunos,
professores e profissionais.
Atuação na área de Divulgação Científica (articulista
imprensa escrita e coordenador de projetos na área da percepção pública da
ciência).
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