AGENDA CULTURAL

21.3.17

Operação Carne Fraca: somos comedores de carniça?


*Hélio Consolaro


Comedores de cadáveres somos, com certeza, pois matamos os animais para comê-los, somos de certa forma necrófagos também; quando fedem, passamos para os urubus, vermes e outros seres vivos que adoram carniça sem lhes fazer mal. No mundo rural, isso acontecia normalmente, de forma simples; no mundo urbano, esse processo ganha complexidade. 

Quando este blogueiro era criança, na zona rural, vivíamos de estilingue na mão, minha mãe sempre me dizia:

- Cuidado! É pecado matar urubu!

Como eu era meio cego e não sabia, só consegui matar um passarinho em toda a minha vida, mas havia um certo cuidado com os urubus, por serem os faxineiros do mundo. Como não sabem caçar, então vivem de comer o fato consumado.

A gastronomia e a culinária escondem o porquê de usarmos a pimenta em alimentos, principalmente nas carnes. Como antigamente não havia geladeira e nem freezer, nossos ancestrais se viravam com outros procedimentos e produtos para conservar a carne, sem mau cheiro, como o charque (sal e sol) e a pimenta.

Se inserimos o vinagre em nossa culinária para desinfetar alimentos crus (os japoneses usam o gengibre para tanto), a pimenta tinha originariamente a função de encobrir o gosto de carne estragada em nossos pratos. 

Sobre a operação "Carne fraca" da Polícia Federal que investiga a venda de carne estragada, empacotada (processada), ou seu reaproveitamento nos embutidos: linguiça, mortadela, salame, presunto, salsicha, há muitas ponderações a fazer.

Isso é como o café. A boa produção vai para a exportação, o café de segunda ou terceira fica aqui no Brasil para o consumo interno. Carne estragada, adulterada e coisas tais, é uma questão nossa, dos brasileiros.

Daqui a pouco, o presidente postiço Michel Temer telefona para os presidentes de outros países e diz:

- Calma! A melhor carne é para a exportação, essas denúncias valem apenas para o mercado interno.
   
Por que a Polícia Federal se meteu nisso? Não é competência do Ministério da Agricultura fazer a fiscalização da carne? Sim, o famoso carimbo do SIF, mas acontece que os fiscais estavam sendo corrompidos pelos frigoríficos.

Toda ação tem efeitos colaterais, uma delas é mostrar que parte de nosso empresariado é corruptor, e sem corruptores não há corruptos. Outro efeito é fazer uma cortina de fumaça justamente na hora em que discutimos a Reforma da Previdência. A terceirização foi votada por trás dessa cortina.

Como também, a concorrência queira prejudicar o Brasil no mercado internacional da carne. E assim por diante.

Se espremermos o nosso cérebro, vamos descobrir outras coisas, como: a carniça está instalada em Brasília.


*Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Membro da Academia Araçatubense de Letras.

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