AGENDA CULTURAL

1.9.20

Destinos separados, felicidade triturada

Grafite em homenagem ao menino Manoel pelo artista plástico Leo Gospel. (Foto: Marina Meireles/G1)
Hélio Consolaro é professor, jornalista, escritor. Araçatuba-SP

O Brasil é um caldeirão de gente de todos os tipos e lados. Praticamos a globalização há muito, e conseguimos, por ação ditatorial de Getúlio Vargas, ser oficialmente um país monolíngue. Isso tudo com o ranger de dentes dos negros, que chegaram em condições inferiores, como escravos.   

Essa escravidão ainda pauta a nossa vida. O governo da época, com a libertação dos escravos, preferiu chamar imigrantes europeus a prestigiar os negros libertos. Foram colocados no olho da estrada e só sobraram as favelas para morar, as beiradas das cidades.

Hoje, os negros e negras (afrodescentes em geral) estão mais com o nariz empinado, chamando às falas seus irmãos brancos, mas no tempo de Marica Crioulinha era "sim, senhor" - "pois, não". Por causa da ousadia dos dias atuais, policiais continuam pondo-lhes o coturno  no pescoço deles, asfixiando-os. 

Toda vez que ouço Marica Criolinha, de Raul Torres e Florêncio, na voz e Rolando Boldrin, fico reflexivo, pensando nos casos de minha família (italianos) com  tias se casando com "morenos". O preconceito era danado, a marginalização na família era certa.  

Ouça a música e acompanhe a letra:



Marica Criolinha
Raul Torres e Florêncio

Meu pai eu quero casá
Com a Marica Criolinha
É verdade que ela é preta
Mas é muito bonitinha
Eu tenho sôdade dela
E ela tem sôdade minha

Reuniu a minha irmandade
Viero me dá conseio
Eu arrespondi que caso
Mesmo que eu caia no reio
Éla é bonita demais
Eu também não sô dos feio

Também veio os meus parente
Tudo pra me atrapaiá
Eu então disse que caso
Nem que eu tenha que apanhá
Pois a cor não vale nada
E a sorte é Deus quem dá

Minha mãe me deu razão
Falou e não disse à toa
Aproveita esta ocasião
Fugindo pra Três Lagoa
Pois case com ela mesma
Que a Marica é muito boa

Cheguei a fazê premessa
E pedido nem sei quanto
Pedi à Nossa Senhora
E ao Divino Esprito Santo
Hoje eu deito na berada
E a Marica tá no canto

Assim, destinos são separados; felicidades, trituradas; assassinatos cometidos. A vida vai ficando feia por causa de preconceito.

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