AGENDA CULTURAL

26.9.06

Vamos ficar?

Hélio Consolaro

Dia do Fico, 9 de janeiro, D. Pedro I disse que ficaria, mas acabou mesmo indo embora para Portugal, deixando o Brasil nas mãos de um menino de seis anos, o filho. Na rua do Fico (Araçatuba tem rua com esse nome) ninguém fica.

Na 1.ª série do ensino médio do Colégio Salesiano, ensino profissionalizante, joguei em pauta o tema “ficar” na aula de redação. Um relacionamento tipo Coca-Cola, que espuma muito, mas não estoura a rolha. Às vezes, chega ao “fique comigo nessa noite”.

Os alunos debateram entre si o tema. Depois, foram convidados o psicólogo Luís Henrique Zago e o padre Pedro Pereira Borges para um bate-papo com a moçada. Debater interioriza mais.

Ficar é experimentar primeiro, depois refletir. É a ética do desejo que começou no escurinho do cinema. Estou com você porque quero e não porque devo. A vontade de Deus não pode ser diferente da minha vontade, porque Ele está em mim, eu estou Nele. Xô, hipocrisia!

Assim, fica-se defronte ao computador, aprendendo por ensaio e erro. Nada de teoria e depois a prática. Pratica-se e teoriza-se simultaneamente. Ficar com a garota, ficar com o garoto é fuçar no outro, aprender o que o outro tem de interessante e prazeroso.

A tevê e depois o computador não são meros aparelhos ou eletrodomésticos numa casa. Eles são estilos de vida, mudanças significativas no ritmo das pessoas. E muitos não percebem isso, só sabem dizer que “o mundo está perdido” e “onde vamos parar”.

Ficar com alguém, às vezes, é abandonar o outro. Assim, a vida é uma conjugação do verbo ficar. Nada é eterno, o “pra sempre” também acaba e a imortalidade acadêmica é uma brincadeira.

E a moçada entende isso muito bem. Pode nem verbalizar nada, mas entende. Eles não gritam, aglomeram-se. E os adultos, como sempre, dizem:

- Essa juventude não tem nada na cabeça!

Sócrates, bem antes de Cristo, já dizia: “Nossos adolescentes atuais parecem amar o luxo. Têm maus modos e desprezam a autoridade. São irrespeitosos com os adultos e passam o tempo vagando nas praças, mexericando entre eles.... São inclinados a contradizer seus pais, monopolizam a conversa quando estão em companhia de outras pessoas mais velhas; comem com voracidade e tiranizam os seus mestres.”

As palavras do filósofo se parecem com as falas de professores, pais e adultos em geral do século 21, mas elas foram ditas há 2.500 anos. Já naquela época, caro leitor, diziam que o mundo estava perdido. E ele continua firme, com todas as suas mazelas. Eu já quis mudar o mundo, hoje sigo a sua marcha.

E você, coroa, fique também, não desista da vida. Deixe o mundo pra lá, tente mudar apenas a si mesmo.

Um comentário:

Anônimo disse...

Achei essa crônica bem interressante...