AGENDA CULTURAL

16.2.07

Personal trainer do ego

Hélio Consolaro

Não sei, caro leitor, se você já conviveu com pessoa mal-humorada. Nossa! É um chute na canela. Às vezes, se acha a dona da verdade, não se questiona em nenhum momento, está sempre certa, não erra. Se alguém atrever a apontar um erro, disfarça, faz que aceita a crítica, mas no momento oportuno, haverá a revanche.

Detesta ser contestada. Quem se atrever, vai caindo na sua tabelinha conceitual. Gente assim tipifica relacionamentos, possui várias gavetas onde joga filhos, esposa, parentes e amigos (se é que os tem).
Ela é muito religiosa, se apega ao sobrenatural com todas as forças, pois não consegue construir sua própria felicidade. Cultos e rezas se tornam momentos de alívios.

Gosta de que todos em sua volta, nem que seja um bando de medíocres, digam:

- Sim, senhor!

- Pois, não...


Bem formal, e que ninguém se atreva a quebrar essa formalidade. Quando está de bom humor, puxa brincadeira com as pessoas mais próximas, mas como só deu patadas, ninguém leva aquilo em consideração, pois todos estão encolhidos debaixo de seus cascos, como tartarugas, se autoprotegendo. Então, ela volta a seu poço profundo.

Pessoa que tenha esse perfil psíquico é um estraga prazeres na família, no serviço. Pode ser até um bom profissional, mas emocionalmente é desequilibrada, não faz nada deslanchar, porque valoriza demais a verticalidade, como chefe ou subordinado. Sua criatividade é quadriculada.

Se for chefe de alguma coisa, uma sessão qualquer, fica prisioneira de espertinhos, que comandam através dele, enchendo sua cabeça de gravetos.


Adora o puxa-saquismo, porque precisa de um personal trainer para seu ego. Considera tanto o puxa-saco que este passa a mandar nele, e ele não percebe isso. Se não houver pessoa assim no ambiente, providencia alguém.

Nem sei, caro leitor, por que estou escrevendo isso. Não sei se é uma auto-análise minha feita no divã. Impossível, tenho lá meus defeitos, mas não sou tão feio assim. Ainda bem que a gente sempre se sente a melhor das criaturas.

“O Consa convive com pessoas assim”, pode perguntar o leitor. Claro, claro. Não se pode fugir dos diferentes, se isolar numa redoma, por isso há o perdão, que me deixa mais saudável.

Rubem Alves compara as pessoas a pipocas na panela. Há quem estoure no tempo certo, outras só mudam ao passar pelo fogo da vida, por exemplo, sobrevivendo após ter uma doença grave ou a um acidente.

Há quem morra piruá, não muda nem com o sofrimento. Talvez, como personagem da trama humana, o mal-humorado cumpre seu papel. Sei lá. Só quero viver e deixar os outros viverem também.

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