AGENDA CULTURAL

15.10.09

Educador pela pedra

Hélio Consolaro



José Fulaneti de Nadai / Arquivo: Folha da Região
Biografia
José Fulaneti de Nadai, 31/12/1939, Alto Alegre, filho de Santo Fulaneti e de Ana de Nadai. Casado com Vânia Maria Guitti, filhos: Alba Regina, João Francisco e Oriana. Professor de Português da rede estadual de 1969-1986. Professor universitário de projeção nacional, sempre convidado a dar palestras pelo Brasil. Trabalhou no rádio entre 1958-68. Graduado pela Unesp de Assis, mestrado e doutorado pela USP. Professor da Fundação Educacional de Penápolis (Funepe) de 1969 a 2005. Lecionou no curso de Jornalismo da Unesp de Bauru.Vereador em Penápolis, de 1983-88. Diretor Regional da Cultura em Araçatuba, governo Montoro.

Este croniqueiro queria vencer na vida e escolheu os estudos como ferramenta. Eu era um jovem estudante do curso noturno em Araçatuba, com deficiência na formação, mas com gana de superar dificuldades e enfrentar desafios. Nem sabia que “vencer na vida” tinha vários significados. Hoje tenho convicção de que “ser” é mais importante que “ter”.
Assim, pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Instituição Toledo de Araçatuba não oferecer cursos à noite em 1969, fui estudar em Penápolis. De repente, na primeira semana de aula, pinta na frente da sala de aula um sujeito franzino, falando difícil e dizendo que era professor de Teoria da Literatura. O garoto Consa não entendia nada, o “home” falava grego. Aquilo foi um desafio. Senti um amargor na boca: não me ensinaram nada! Onze anos de escola, pobre de corpo e alma. Vencer na vida não estava fácil.
Esse professor que falava complicado era o José Fulaneti de Nadai. Nas férias de julhode 1969, numa visita a Penápolis durante o dia, fui até a casa do “Fula” (assim era chamado pelos alunos), no maior acanhamento, pedir alguns livros emprestados para o mestre, eu precisava de recuperação. Ele me atendeu com entusiasmo, voltei com mãos cheias de livros. A partir daí, se eu não ler alguns livros nas férias, parece que elas não existiram.
Em 1970, minh’alma estava em ebulição, porque ele (e outros professores) não se limitava a ensinar, queria passar a seus alunos uma visão de mundo, para que cada um fosse protagonista de sua própria vida.
Numa recente entrevista à Folha da Região (24/5/2009), se reportando à perseguição política promovida pela ditadura militar da qual também foi vítima, ele declarou: "Eu sempre busquei conscientizar meus alunos, meus amigos docentes e outras lideranças com o uso da palavra".
A maior vitória daquela turminha que curtia o Fula, ia discutir literatura e política em torno de uma mesa de bar (foi com ele que aprendi a tomar Campari), foi descobrir que era tímido e era preciso agir para arrumar-lhe uma namorada, e com a Vânia ele está casado até hoje.
Fulaneti é o ícone de um professor que, além de cumprir bem seu magistério, soube usar a sua cátedra para mudar a vida de seus alunos. Naqueles anos de chumbo, promover o protagonismo era chamado de “proselitismo político”. Hoje, com cabeças mais arejadas, tem o nome de “construção da cidadania”.
Na sua coluna poetagem, Tito Damazo, que fazia parte de minha classe e também sobremaneira teve influência de Fulaneti até nos tiques nervosos, escreveu em sua coluna Poetagem: “... em Penápolis, reside um dos melhores intérpretes e estudiosos da poesia de João Cabral. Trata-se do prof. Dr. José Fulaneti de Nadai, cujo mestrado: O deus da sede: uma análise de paisagens com figuras de João Cabral de Mel Neto, USP, 1978 e doutorado A voz alta de João Cabral, USP, 1994, são tidos como dois dentre alguns excelentes estudos feitos em torno da obra de João Cabral”. Possui livro publicado a respeito pela Abril Cultural.
Fulaneti fez muitos jovens descobrirem que no meio do caminho tem uma pedra, mas ela pode ser uma boa mestra.

2 comentários:

Patrícia Bracale disse...

Qdo ao tropeçar em uma pedra,
Conseguirmos chamá-la de PEDRA...
Já é meio caminho andado.

Leonardo Concon disse...

Caramba... ele fez parte de minha vida, da juventude e da formação autodidata em jornalismo. Grande 'Fula', saudades... o gestual com as mãos continua o mesmo. Saudades da Vânia também. Preciso ir a Plis urgente. Abração, Hélio.. Agora tô com esse blog: wwww.leonardoconcon.com.br coisas de Olímpia e da região, um pouco de tudo. Abraços.