AGENDA CULTURAL

16.10.09

Só os idiotas

O maior prazer de um homem inteligente é armar-se de idiota diante de um idiota que se arma de inteligente.

Hélio Consolaro

Outro dia, marquei uma audiência com o Pe. Charles Borg, de cujos artigos dominicais sou leitor assíduo.


Na hora de me atender na sacristia, um chamado: morrera um paroquiano. Fiquei pacientemente à espera, porque a morte não tem agenda e muito menos respeita compromissos alheios.

Ela chega com todo o seu poderio, carrega a pessoa. Às vezes, sem preparação alguma, tão de repente. De insubstituíveis passamos a ser uma peça que é retirada do universo ou de um determinado espaço dele. Um ano depois, ninguém mais se lembra da gente. Há aqueles que pagam anúncios em jornais em homenagem do falecido, de mês em mês, de ano em ano, resistindo, mas o esquecimento é fatal.

Não sei se após a morte teremos outra configuração, ou ela é apenas uma passagem de realidades ou tudo não passa da morte do ego. Alguns acreditam na transcendência, na ressurreição; outros, na imanência, a matéria só muda de configuração, se tornando um outro arquivo, como no computador. Se for apenas a morte do ego, aí, sim, realmente nos tornamos universo, livres de nós mesmos.

Cada religião prega uma coisa, chama o Criador de seu. E há cada babaquice, verdadeiras histórias de carochinhas. Como o céu é prometido aos pobres de espírito, tudo é possível. Ou cremos ingenuamente nas homilias ou nos tornamos céticos, como Tomé.

Como essas coisas sobrenaturais não me causam curiosidade, dou de ombros. Creio em Deus e em dois mandamentos: amar a mim mesmo e por consequência o próximo. Apesar de minhas doiduras, Deus tem sido muito bom comigo.
Parece um paradoxo, mas só entendemos a vida a partir do momento em que aceitamos a morte como elemento do jogo. Estou envelhecendo, o caroço da morte está grande dentro de mim e num determinado momento ele vai tomar conta de meu ser.

Isso não me deixa deprimido, porque me acho realizado, pois enfrentei todos os desafios que me foram apresentados, sem ser um praticante de esportes radicais. Quando o gigante era grande de mais, tive a sabedoria de contorná-lo.

Outro dia, uma senhora me disse que sua morte estava marcada para o dia 6 de outubro. Essa data aparecera numa visão em que a santa passou a data. Não sei se a santinha se esquecera de dizer o ano ou errara mesmo, mas a senhora não morreu. Está vivinha.
A senhora levou a visão tão a sério que se despediu de todos. Na verdade, ela andava meio desprezada, sem marido e rodeada de filhos ingratos. Dizer que ia morrer foi uma forma de chamar atenção para si, preencher sua carência afetiva. Pedir socorro.

Isso tudo se parece com filosofia de para-choque de caminhão, mas a vida é assim mesmo, tão simples. Complicar para quê? Só os idiotas a levam sério. Acha que tudo está errado, só eles estão certos.


5 comentários:

Rita Lavoyer disse...

Nossa! Quase me perdi na leitura, mas logo me achei dentro do texto.É sério.

Patrícia Bracale disse...

Morremos a cada dia,
Treinamos a morte qdo dormimos.
Pensamos na "MORTE" só em certos momentos, quem é que atende no portão alguém vendendo plano de caixão?
A verdade é que este corpo envelhece,
que por qualquer motivo podemos ter que deixá-lo.
Sei que tudo é ENERGIA e que sei lá para onde for, esta "ENERGIA MINHA" ainda existirá.

Charlles Nunes disse...

Olá Consa!
Vim dar uma espiada no novo livro, e acabei lendo vários textos.
Você sabe 'fisgar' o leitor, hein!?
Muito obrigado por me deixar fazer parte do seu grupo de amigos 'idiotas'!
Sobre a morte, só tenho 8 palavras: "às vezes, nem temos tempo pra correção..."



(Aha, você contou as palavras!:-)

HAMILTON BRITO... disse...

COM AQUElE A I N D A ( sinais de inteligência ) o senhor jogou mais de noventa por cento dos santinhos no brejo...tadinhos mestre, menos......

Marisa Mattos disse...

A única certeza que temos na vida é a morte...e ainda nao sou tão "vacinada" como voce sobre ela...quero que fique o mais distante possivel por muito tempo ainda..ehehehhehe...