Hélio Consolaro*
Sempre afirmo que ser cronista é ver chifres em cabeça de cavalo. Ninguém vê nada, e o cronista enxerga tudo, aquelas enormes aspas na cabeça eqüina. Ele observa o inusitado, lê por trás dos fatos, aprofunda-se no leito do rio, não fica apenas no raso, na beirada do assunto.
Eu caminhava no calçadão de Araçatuba, naquela muvuca de fim de semana, e vi dois jovens de mãos dadas. Héteros, uma moça linda, alta, sorridente e ele um rapagão atlético, feliz da vida ao ostentar aquele monumento conquistado. Estavam apaixonados.
“Como a juventude é bela!” - pensei. A estrada da vida é larga e não se pensa no fim, porque a marcha mal começou. Lembrei-me de meus tempos de menino, de adolescente, de rapaz, naquela mesma rua, a Marechal Deodoro. A vida me foi madrasta no começo, mas a juventude era o motor, o ânimo.
Depois de alguns metros, passo por um casal, também hétero (agora precisa explicar as coisas direitinho). Eles conversavam e ouvi uma frase desoladora:
- Hoje à noite, você roncou como uma porca!
A velhice é mesmo uma b... Perdemos o otimismo, ficamos amargos, cegos. Principalmente se não aceitamos como fato normal da vida a sequência de nossa finitude.
Não inventei nada caro leitor, não forcei a barra. Os fatos ocorreram nessa sequência no calçadão. Apenas tive olhos e ouvidos para sentirem, interpretá-los. O universo quis me dar alguma lição. Apesar de bronco, tive sensibilidade para percebê-la.
Vá, Consa, ser um velhinho na vida... Sem esperneio, hein!
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