AGENDA CULTURAL

8.6.14

Estamos cansados da cidade


Hélio Consolaro*

Lendo uma entrevista do arquiteto e urbanista Jorge Wilheim na revista E Sesc-Sp, analisando nossa imobilidade urbana,  me lembrei dos poetas árcades (ou neoclássicos) do século 18, quando tínhamos uma Brasil ainda rural e a ser desbravado, na velha concepção colonialista. Eles, já naquela época, desprezavam a cidade, que era Ouro Preto-MG, que continua pequena.
"Fugere Urbem". Esquerda: Vida infeliz na cidade. Direita: Vida feliz no campo
Aliás, pregavam a fuga da cidade (fugere urbem), pois o bucolismo era o ideal de vida, simples, natural, junto ao campo, distantes dos centros urbanos. Como na música "Casa no campo", de Zé Rodrix, cantada por Elis Regina. Tal princípio era reforçado pelo pensamento do filósofo francês Jean Jacques Rousseau, segundo o qual a civilização corrompe os costumes do homem, que nasce naturalmente bom.

Eis um trecho de Marília de Dirceu, de Tomás Antônio Gonzaga, poeta brasileiro, árcade:


Irás a divertir-te na floresta, / Sustentada, Marília, no meu braço; / Ali descansarei a quente sesta, / Dormindo um leve sono em teu regaço: / Enquanto a luta jogam os Pastores, / E emparelhados correm nas campinas, / Toucarei teus cabelos de boninas, / Nos troncos gravarei os teus louvores. / Graças, Marília bela, / Graças à minha Estrela!
(Arcimboldo, Giuseppe. Primavera. c. 1573. 
Óleo sobre tela. Musée du Louvre, Paris).
Hoje, a fuga para os ranchos é um sentimento de fugir do urbano, porque a cidade está cansando a todos com seus congestionamentos e excessos de carros. Araçatuba, por exemplo, supera Bauru, Ribeirão Preto, Prudente, Bauru em número de veículos por habitante.

Eis algumas frases pinçadas da entrevista de José Wilheim na revista E do Sesc-SP:


"O momento crucial da cidade, hoje, é que em vez de uma mobilidade temos uma imobilidade”

“A sociedade de São Paulo se divide em duas: aqueles que usam ônibus e aqueles que não usam, deslocando-se a pé, ou de automóvel”

“Não se trata de uma decisão de abandonar o carro, mas de ser forçado a fazê-lo”

“O que acontece no nível da calçada, dentro dos lotes, interessa vitalmente à cidade”
A música caipira cantou muito a saudade da roça, o êxodo rural, como na "Saudade de minha terra", versos de Belmonte e Goiá:
De que me adianta viver na cidade
Se a felicidade não me acompanhar
Adeus, paulistinha do meu coração
Lá pro meu sertão, eu quero voltar
A cidade cansa, principalmente se não houver planejamento. E as nossas foram construídas a esmo, sempre fazendo o puxadinho. 

*Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Secretário municipal de Cultura de Araçatuba-SP 

Araçatuba tem a segunda maior frota
 por habitante entre cidades médias e
 grandes

Proporcionalmente, quantidade de veículos é maior do que Ribeirão, Bauru e São José dos Campos
Araçatuba tem a segunda maior frota de veículos, proporcionalmente à quantidade de habitantes, entre as principais cidades de médio e grande porte do Estado de São Paulo. De acordo com levantamento divulgado até abril pelo Denatran (Departamento Nacional de Trânsito), a frota do município atingiu 150.160 veículos para uma população de 190.536 (estimativa do IBGE para 2013), o que representa 0,788 veículos para cada habitante.

Proporcionalmente, a quantidade de veículos rodando em Araçatuba é maior do que a existente em cidades de porte populacional e econômico superiores como São José dos Campos - considerada um ‘oásias’ de desenvolvimento", de Bauru, Franca e Ribeirão Preto (esta última conhecida como a "Califórnia Brasileira"), além de municípios de tamanho e nível de desenvolvimento semelhantes, como Marília, Presidente Prudente e Araraquara. A cidade só perde, e por pouco, para São José do Rio Preto, que concentra 0,790 v/por habitante. A medição da frota leva em consideração automóveis, caminhões, caminhonetes, ônibus, microônibus, motocicletas, motonetas e ciclomotores.

E os números não param de crescer. Em abril de 2004, a cidade concentrava 81.324 veículos. Na comparação com o mesmo mês em 2014, o salto é de 92,35%, ou seja, em dez anos a quantidade de veículos quase dobrou. O número de motos por pouco não chegou lá: cresceu no mesmo período 94,6%.

Uma das explicações para o crescimento da frota por aqui é o número de motocicletas em circulação. Em 2013 Araçatuba foi apontada pelo Denatram como a cidade com o maior número de motos rodando em todo o Estado de São Paulo, com mais de 50 mil entre motocicletas, motonetas e ciclomotores.

"Hoje em dia é muito fácil comprar uma motocicleta. Antigamente, até 10 anos atrás, era difícil comprar uma bicicleta, mas nos tempos atuais é mais fácil comprar uma motocicleta do que uma bicicleta. Isso se deve ao preço baixo e a facilidade de comprar, aliados ao poder de compra das famílias", analisa o secretário municipal de Mobilidade Urbana, Delcir Getúlio Nardo.

O secretário relaciona ainda o crescimento ecônomico como outro fator para o aumento na quantidade de veículos.

"Araçatuba passou, nos últimos cinco anos, por um crescimento econômico sustentável muito grande devido à política econômica do atual governo, que aliou qualificação de mão de obra e atração de investimentos. Isso proporcionou uma melhoria da qualidade de vida e crescimento do poder de compra das famílias, que passaram a ter mais de um veículo para atender às suas demandas", finalizou

4 comentários:

papa.marcello disse...

Caro Consolaro, o problema não são as cidades em si, mas a política de urbanismo. Tomando Araçatuba como exemplo, nossa cidade não tem barreiras físicas geográficas em sua periferia, logo, poderia crescer horizontalmente com gabarito de no máximo 3 pavimentos como diversas cidades do interior dos EUA, invertendo a tendência atual de verticalização concentrada em poucos bairros. O que ganharíamos com isso?
1 - Mais luz, ventilação e privacidade para todos, ao impedir que torres acabem com a salubridade de quarteirões inteiros;
2 - Menos congestionamentos, mais vagas nas ruas e a possibilidade de crescer ordenadamente, sem saturação das vias públicas, redes de energia, água e esgoto, inicialmente não projetadas para tamanha concentração;
3 - O crescimento imobiliário horizontalizado acabaria com o oligopólio de uma meia dúzia de grandes construtoras e tornaria a construção civil local um mercado acessível à inúmeros pequenos empreendedores, o que além de distribuir renda é particularmente interessante para uma cidade com diversos cursos de engenharia e arquitetura em andamento;
4 - Até mesmo para os fazendeiros locais, que, até onde sei, foram os precursores da verticalização urbana araçatubense, a horizontalização seria algo muito mais interessante e lucrativo, posto que, as terras lindeiras à cidade passariam a ser vendidas por m2 e não mais por hectare;
5 - Além disso, o espraiamento da cidade e de seus moradores teria efeito análogo na economia, já que inúmeros pequenos comerciantes sediados em bairros periféricos veriam seus negócios crescerem e multiplicarem-se junto com este novo desenho de cidade;
A questão inversa também deve ser formulada. O que perderíamos com um modelo urbanístico horizontalizado?
Sinceramente, não sei, nada me ocorre. Entretanto ao discutir esta questão com um amigo, este alegou que teríamos desmatamento ao redor da cidade. Não consigo enxergar isto, no caso de Araçatuba, como um argumento relevante, explico: Temos florestas e matas preservadas ao nosso redor? Não, o que temos são extensões intermináveis de cana e capim. Logo, uma nova política urbana integrada a uma nova política paisagística resolveria facilmente esta questão ao prever não somente habitações, mas também áreas verdes, praças, solos permeáveis e ruas arborizadas. Neste cenários, provavelmente teríamos muito mais árvores na periferia da cidade do que temos hoje dentro de pastos e canaviais.

papa.marcello disse...

Desculpe, esqueci de assinar o comentário anterior.
Marcello Papa
arquiteto e urbanista, atualmente servidor público estadual em Araçatuba.

Anônimo disse...

Prezado Consolaro
Acho que alta proporção de veículos por habitante é índice de doença urbana e não de saúde econômica. Como grandes frotas necessariamente são compostas principalmente de veículos particulares, seu grande número indica que a imensa maioria da população rejeita o uso de transporte coletivo em favor do individual. Um bom urbanismo e uma boa administração municipal procuram criar condições para que a maioria use o transporte público e uma minoria o individual.
Não digo isso para diminuir Araçatuba, pois sou de Rio Preto, que encabeça a lista. Confesso: em décadas, uma única vez tomei o ônibus, acho que para buscar o carro na revisão. Azar o meu e o seu. Gostaria que ambos morássemos em cidades que convidam cada pessoa a compartilhar o transporte coletivo com seus concidadãos.
Herbert - SJ Rio Preto - SP

Hélio Ninha disse...

Bom dia !...
Xará...
Que coisa linda?...só no papel e no comentário é claro...
Sabe quando isso irá acontecer...nunca...ou só no dia que o Muleque Saci, cruzar as pernas ou o vampiro doar sangue.rsrsrs...
Sonhos e Fantasias....estamos no Brasil véio...
Abçs
Hélio Ninha