Odette Costa, Folha da Região, 22/2/1998 - Caderno 2, p. 4)
Camila Tomashinsky chegou à região no começo do século; ela fugiu da Rússia com o filho durante a Revolução de 1917
Camila Tomashinsky chegou à região no começo do século; ela fugiu da Rússia com o filho durante a Revolução de 1917
Quando da Revolução Russa em 1917, sabemos que o país dava privilégios aos grandes artistas, razão por que as mais diferentes manifestações do espírito deixaram obras imorredouras, que o comunismo não conseguiu destruir.
E entre os cultores da arte,
mereciam destaque os músicos e instrumentistas, para deleite dos grandes saraus
nos palácios em noites memoráveis de beleza, pompa e bom gosto.
Parece incrível que D. Camila
Tomashinsky e seu marido foram desses iluminados, que tocando maravilhosamente
tiveram a honra de abrilhantar festas no Kremlin, executando números clássicos,
ela no piano e ele, ao violino. Quem diria que uma podre pianista que morreu em
Araçatuba chegou a tocar com destaque para “Czar de Todas as Rússias”.
Mas a revolução não perdoou nem
os grandes talentos. Ou melhor, os teria poupado se aderissem à sua causa.
Exatamente por não concordar que a família Tomashinsky fugiu em um navio
cargueiro para vir para o Brasil. Dizem
os que a conheceram, que na fuga um de seus filhos teria sido fuzilado,
quando alvejaram os fugitivos. Mesmo assim, sem olhar para trás, ela agarrou-se
ao filho menor e conseguiram embarcar. Não sabemos se o marido também veio.
Consta que se instalou em
Penápolis. E que seu filho casou-se com uma moça chamada Nina. Ela conviveu
sempre com o casal, pois a nora tendo aprendido piano, também lecionava para as
alunas menores. Muitas de suas alunas de piano se tornaram professoras, como
Dolores Castilho e Débora Guarinon.
Ela impressionava as alunas e as
suas famílias com as quais convivia pela maneira de ser, resultante da educação
rígida que recebeu, naturalmente em meio a pessoas importantes e dentro dos
padrões culturais daquela época.
O que é interessante ressaltar é
que a par de toda essa formação ela era extremamente católica, com uma noção
muito arraigada dos deveres cristãos , a ponto de viver em voto de pobreza e de
amor ao próximo. As vicissitudes não lhe esfriaram o ânimo apostólico e ela
manteve uma visão muito límpida do que se deve ou não fazer para ser útil ao
meio em que se vive. Foi ministra da Ordem Terceira Franciscana, visitando os
membros da irmandade e pregando as virtudes do bom cristão. O filho também foi
muito culto. Era numismata, filatelista e
enxadrista.
Ela faleceu em 5 de janeiro de
1958 e seu enterro no dia seguinte foi dos mais concorridos, pelos méritos que
tinha junto à sociedade de Araçatuba, terra que ela escolheu para viver as
saudades da Rússia e a emoção dos seus últimos dias.
Algumas observações deste blogueiro (Hélio Consolaro, secretário municipal de Cultura de Araçatuba-SP):
Algumas observações deste blogueiro (Hélio Consolaro, secretário municipal de Cultura de Araçatuba-SP):
- Camila Tomashinsky empresta o nome a uma escola municipal em Araçatuba (Emeb) que na rua Bolívia, bairro Aclimação.
- Dizem que Odette Costa fazia apenas registro dos bem-sucedidos na vida, os vencidos passavam ao largo de suas preocupações. É verdade, pois seu viés era de uma colunista social, portanto, os bacanas eram prestigiados por ela. Mas se ela não tivesse uma preocupação histórica, nem a elite da cidade teria a sua história registrada.
- Araçatuba é uma cidade bem musical. Nela, ocupava lugar privilegiado o piano. Nem que fosse uma preocupação de moças de famílias bem aquinhoadas, mas até hoje sentimos isso na cultura araçatubense. Camila Tomashinsky foi uma das responsáveis pela presença do piano (hoje, teclado) na cidade.
- Pela legenda da foto, percebemos que as personalidades nela já nem são lembradas pelas novas gerações. A cidade se renovou, mas não podemos deixar que sua história, feita por vencidos e vencedores, caiam no esquecimento.
Um comentário:
Que incrível achar esta matéria... minha avó, d.Heloisa (hoje com 91 anos), está nessa foto ao lado da sra. Dolores. Me contou na presente data que teve aulas de piano com a d. Camila e que participava dos recitais que ela promovia. Uma vez, disse que gostaria de aprender Chopin, mas d. Camila retrucou dizendo que somente quando ela estivesse apaixonada. Quando minha avó se casou, presenteou-a com partituras do compositor! Obrigada pela matéria.
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