AGENDA CULTURAL

11.10.16

Este inferno de amar

Hélio Consolaro*

Nem sempre quem canta o amor tem sorte nele. Veja alguns exemplos de vida e obra entre poetas lusófonos.

Luiz Vaz de Camões definiu o amor como um sentimento contraditório: “um não sei quê, que nasce não sei onde,/vem não sei como, e dói não sei por quê”. Na volta do degredo, o navio de Camões naufragou. E ele não sabia se salvava a arca com os originais de “Os Lusíadas” ou sua namorada chinesinha, Dinamene. Conclua por qual ele optou...

Bocage, sonetista português, fez versos lindos para a sua pastora: “Tudo em tua presença degenera/ Nada se pode comparar contigo". Mas bastaram três anos de ausência de Bocage em Portugal, para, no retorno, encontrar sua namorada casada com seu irmão Gil.

Tomás Antônio Gonzaga, 40 anos, cujo pseudônimo pastoril era Dirceu, se apaixonou por Maria Doroteia, jovenzinha com menos de 20 anos, sua Marília: “Eu tenho um coração maior que o mundo/tu, formosa Marília, bem o sabes;/ um coração, e basta,/ onde tu mesma cabes”. Preso por participar da Inconfidência Mineira durante três anos, Gonzaga foi degredado para Moçambique, casou-se com outra na África, nunca mais escreveu um verso.

Castro Alves se apaixonou por Eugênia Câmara – atriz portuguesa -  bem mais madura que ele. Ela encenava peça de teatro do poeta: “Gonzaga ou a Revolução de Minas”. Ele lhe dedicou os versos seguintes: “Teu amor na treva é – um astro,/ No silêncio uma canção,/ É brisa – nas calmarias / É abrigo – no tufão”. Transferiu-se da faculdade de Recife para São Paulo por causa dela, acabou dando um tiro no próprio pé, morreu aos 24 anos.  Brigas por ciúmes foram motivos da separação do casal. 

É assim mesmo. Poeta feliz sorri, não faz versos.

*Título de poema de Almeida Garret.


*Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Membro da Academia Araçatubense de Letras.


ESTE INFERNO DE AMAR

Este inferno de amar – como eu amo!-
Quem mo pôs n’alma… quem foi?
Esta cham que alenta e consome,
Que é a vida – e que a vida destrói-
Como é que se veio a atear,
Quando – ai quando se há de ela apagar?

Eu não sei, não me lembra: o passado,
A outra vida que dantes vivi
Era um sonh talvez… – foi um sonho –
Em que paz tão seran a dromi!
Oh! que doce era aquele sonhar…
Quem me veio, ai de mim! desperatar?

Só me lembra que um dia formoso
Eu passei… dava o Sol tanta luz!
E os meus olhos, que vagos giravam,
Em seus olhos ardentes os pus.
Que fez ela? eu que fiz? – Não no sei;
Mas nessa hora a viver comecei…

Almeida Garrett

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