Sob um forte clima de revolta, o vendedor ambulante Luiz
Carlos Ruas, de 54 anos, foi sepultado terça-feira, 27/12, no cemitério Vale da
Paz, em Diadema, Região Metropolitana de São Paulo. Familiares e amigos
expressaram indignação com a agressão contra o homem e aos gritos cobraram
“justiça” para a dupla flagrada cometendo o crime na noite de Natal.
EDUARDO GUIMARÃES - 28/12/2016
Pessoas que conviviam diariamente com Ruas destacaram a boa
relação que ele mantinha com os moradores de rua da região, fornecendo
alimentação a eles com frequência.
A personalidade generosa foi ressaltada como parte da rotina
do ambulante. “Ele acordava cedo todos os dias e dava cafezinho e comida aos
mendigos. Sempre foi um cara de paz e que ajudava a todos”, disse a dona de
casa Maria de Fátima Ruas, de 53 anos, irmã da vítima.
Além dela, Ruas, que era casado há 32 anos, tinha outros
dois irmãos.
Morador do Brás, o ambulante trabalhou na entrada da Estação
Pedro II do Metrô paulistano nos últimos 20 anos.
Segundo familiares, ele havia decidido prolongar a jornada
de trabalho na última semana visando a quitar uma dívida de IPVA. O seu carro
havia sido recuperado pela polícia após um roubo sofrido, mas estava detido em
razão do débito.
O advogado Marcolino Nunes Pinho, defensor dos dois homens
que espancaram até a morte o ambulante, disse que seus clientes alegam que
partiram para briga naquela noite porque um deles teve o celular roubado por um
grupo de pessoas do lado de fora da estação Pedro 2°, onde as câmeras do Metrô
não conseguem captar.
Ainda segundo a defesa, os dois agrediram Ruas porque o
vendedor também teria se envolvido na briga. “O senhor Luiz Ruas foi tentar
ajudar os travestis, que ele conhecia lá, e deu uma garrafada na cabeça do
Alípio. Aí, ficou nervoso porque tomou a garrafada e foi para cima dele. Ele
disse que nem entendeu porque aquele senhor se envolveu na confusão. Deu uma
garrafa nele”, disse o advogado.
Uma quantidade interminável de pessoas desmente a defesa dos
assassinos, mas não importa. O que importa é constatar como a maldade não se
contenta, não se satisfaz com nenhum feito hediondo, tentando sempre, sempre ir
mais longe, mais fundo.
Ruas foi espancado na noite de Natal por defender uma
transexual que estava sendo agredida covardemente por DOIS homens fortes. Aos
53 anos, não precisava se importar. Não era homossexual, não era segurança, não
era pago pelo metrô. Mas se importou.
Ao tentar defender um cidadão que habita o degrau mais
estigmatizado da escala social, o ambulante praticou o gesto máximo da
ideologia cristã: o amor ao próximo, a doação, o sacrifício pelo semelhante não
importando o quanto ele seja humilde.
Quantas pessoas neste planeta, na noite de Natal, fizeram
alguma coisa tão importante por alguém que não conhecem e com a qual nada têm
em comum? Quantas pessoas deram tanto sentido ao que se comemorava naquele dia
quanto deu o ambulante Luiz Carlos Ruas?
A brutalidade das agressões que o ambulante heroico sofreu
fez com que seu corpo tivesse que ser velado com o caixão fechado, pois foi
desfigurado pelos carrascos que lhe decretaram a pena de morte e que ainda
contrataram um advogado que agora está acusando a vítima pelo ato bárbaro que
seus clientes praticaram.
Ao interpelar dois brutamontes enfurecidos e descontrolados,
Ruas precisou de muita coragem. Uma coragem que faltou a todas as outras
dezenas de pessoas que passavam pelo local e assistiram inertes ao massacre de
um homem que morreu de forma tão apavorante por se importar em uma cidade onde
ninguém se importa com ninguém.
PS: é revoltante como a mídia acoberta o metrô de São Paulo
pela falta de segurança absurda no local. Por que será, não?
2 comentários:
Que esplêndida esta outra face do Consa. Teve notícia do acontecido, prestou atenção nos detalhes, em especial quanto ao bom caráter do Sr. Ruas. Tirou de seu tempo tempo para lamentar o acontecido. Aprendi muito com você, caro Consa. Mujto obrigado.
Pois é, e assim caminha a humanidade.
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