AGENDA CULTURAL

27.1.21

Por gostar de mim, apesar de mim

 
Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Araçatuba-SP


Os poetas, os cronistas, os escritores em geral são leitores de outros artistas da palavra. Às vezes, chegam ao exagero de dizer que trocaria toda a sua obra por aquele verso do outro, de tão maravilhoso.

Segundo Carlos Heitor Cony, fizeram uma vez um concurso para descobrir qual era  verso, isolado, sozinho, o mais bonito da literatura brasileira. Ganhou estourado o de Castro Alves: "Auriverde pendão da esperança".

Manuel Bandeira escolheu um verso da música de Orestes Barbosa, Chão de estrelas: "Tu pisavas os astros, distraída". Nunca o barraco pobre, coberto de zinco perfurado, banhado pelo luar, foi tão valorizado.  

Um outro verso bem escolhido foi o de Raimundo Corrêa, do poema "As pombas": "Raia sanguínea e fresca a madrugada". Mal sabiam da acusação ou não lhe deram ouvidos de que tal poema era um plágio de um outro composto pelo francês Theophile de Gauthier.

Na música "Dois pra lá, dois pra cá", de Aldir Blanc,  também há um verso que teve votação no concurso: "Um torturante band-aid no calcanhar".

No show de Maria Bethânia, "Abraçar e agradecer", que tem um caráter de despedida, há quase dois versos que gostaria que fossem meus, caso eu fosse tão rico em sentimentos: "de gostar de mim, apesar de mim". Um agradecimento aos amigos.

Não há coisa mais feliz na vida de ter a alegria de ser quem é e possuir amigos que o aceitam como é. Se não for assim, não é amigo, não é pessoa amada. Quem vive me apontando os meus defeitos a toda hora, dizendo que eu deveria ser diferente, pode ser tudo, menos alguém que me ame. 

"Por gostar de mim, apesar de mim" é uma forma mais cult, mais delicada e com requinte, mas não menos autêntica, de dizer: "Você não presta, mais eu eu te amo", versos de uma música brega. 

Tais versos embelezaram o show de Bethânia. Talvez eu tivesse meio parecido com o eu lírico da música "Telegrama", de Zeca Baleiro: "Hoje eu acordei com uma vontade danada / De mandar flores ao delegado / De bater na porta do vizinho e desejar bom dia / De beijar o português da padaria". 

ASSISTA AO SHOW, CLICANDO AQUI

6 comentários:

Alcino disse...

Ótimo Leitura

Ventura Picasso disse...

O verso mais atual da nossa historia: "Independência ou morte"! (D. Pedro 1º - lá no Ipiranga) ...

Eliane Martos disse...

Gostamos de você, Mestre, apesar de ser você!!!

Maria zei disse...

Lembrar dos versos que se imortalizam pela belea,simplicidade mas expŕimindo contéúdo, é uma dádiva.

Maria zei disse...

Amei seus VERSOS.

Maria zei disse...

Que tema lindo.