AGENDA CULTURAL

23.2.22

Violência inocente ou sem querer existe? - Alberto Consolaro

       

Rosa vermelha e cravo branco felizes em figura do livro de Martinho da Vila!

Maria, ao jogar água sobre Natália, bate o balde de plástico na cabeça! O ato foi considerado violento pela direção do programa BBB e Maria foi desclassificada e retirada da casa!

Até o momento de ser eliminada, ela reconheceu ainda no programa, que as vezes perde a tranquilidade e externa sua agressividade frente a uma situação hostil, como também aconteceu ao colar uma etiqueta na testa de Arthur Aguiar, outro participante. Maria disse que as vezes acontece no seu dia a dia esta agressividade e que já estava em tratamento, reconhecendo o problema.

A agressividade e outras situações de rispidez, falta de respeito ao espaço e ao corpo alheio, assim como o linguajar chulo e a necessidade de se impor a qualquer custo tem muito a ver com a infância e a vida familiar. Os exemplos e paradigmas construídos na infância estão ligados a padrões de repetição sociais e familiares. Desta forma se entende o assédio moral, sexual e outras formas de abusos, inclusive a violência doméstica. Em quase todos os casos, infelizmente, há relato anterior destas situações como abusado quando ainda era criança ou adolescente.

Paralelamente a estes episódios televisivos, estava lendo o livro infantil “A Rosa Vermelha e o Cravo Branco” de Martinho da Vila que, além do mundo do samba e do carnaval, também frequenta a autoria do universo dos livros (Lazuli – Cia Editora Nacional). Neste livro, de forma singela e lúdica, ele questiona na sua história ficcional, as letras de algumas músicas e contos infantis.

ROSA E CRAVO

Uma das mais clássicas e antigas músicas infantis gravada até pela Xuxa é “O cravo brigou com a rosa” que dizia: “O cravo brigou com a rosa / Debaixo de uma sacada / O cravo saiu ferido / E a rosa despedaçada”. Até parece inocente, mas tem briga, agressão e ferimentos.

Cantada e repetida pelos pais, avós e coleguinhas não tem como não achar normal brigar e agredir ao outro “como coisas do dia a dia”, ou seja, normal! Mas mesmo assim, na sequência, a letra conta que os dois, ainda assim, irão se casar! Martinho sugere que se cante esta música com pequenas modificações ficando assim: O cravo / Dançou com a rosa/ Debaixo de uma sacada / O cravo ficou caído / E a rosa mais perfumada. Convenhamos que ficou bem mais bonita esta versão! O termo caído significa apaixonado.

PAU NO GATO

A violência e a falta de respeito, pautados pela deselegância verbal, muitas vezes são repassadas sem que percebamos, pois ligamos o dia a dia no automático e nem damos conta disto. Um exemplo disto é a música “Atirei o pau no gato” que dizia: “Atirei o pau no gato / Mas o gato / Não morreu / Dona Chica / Admirou-se / Do berro que o gato deu / Miau.” Uma violência cantada de forma desnecessária e gratuita, sugerindo que o normal é tacar o pau em qualquer gato que se encontre.

E Martinho da Vila sugeriu-se no livro que se cantasse assim: Não atire o pau no gato / Porque o gato vai sofrer / Dona Chica / Foi quem disse / E falou que o gato era seu / Miau! A letra modificada traz um cuidado especial com os animais e ressalta o cuidado que os donos devem ter com seus pets.  

REFLEXÃO FINAL

Você já refletiu sobre a origem da violência que mora dentro de nós? Será que foi uma música, um filme, um game ou uma pessoa que serviu de exemplo? Afinal, nascemos inocentes e pacíficos! Ou não seria assim?  

 Alberto Consolaro - professor titular
pela USP - consolaro@uol.com.br

 

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