A saburra evolui para a língua pilosa! - Alberto Consolaro

Aspectos da língua normal, saburrosa e pilosa 

O dorso da língua parece a pele depois de uma barba feita, pois tem milhares de papilas filiformes como “pelos” bem curtos e sem cor, que a deixa como uma discreta lixa. O atrito da língua no palato e dentes faz uma autolimpeza, mas bem menos eficiente na parte central posterior, a frente do ‘V’ lingual.  A própria pessoa limpa bem menos este local, por medo de ânsia que é a sensação ou mal-estar que prenuncia o vômito, também chamada de enjoo ou náusea. Mas, se a escova e ou o limpador agir de trás para frente, esta sensação não ocorre!

SABURRA?

Saburra lingual é uma camada branca ou amarelada, mal cheirosa, formada no dorso da língua pelo acúmulo de restos alimentares, muco salivar, células descamadas e muitas bactérias, vírus, fungos e parasitas. Saburra vem do latim para identificar a areia grossa ou saibro usado como lastro nos navios, mas também é usado para nominar a substância que reveste alguma superfície como camada ou casca.

O sinônimo de saburra é sarro, por isto que a expressão popular “tirar o sarro” é se esfregar tanto em alguém a ponto de tirar todas as camadas e sujeiras acumuladas nas superfícies, mas sem chegar ao final do ato sexual. Ou ainda pode significar zoar tanto a pessoa que ela fica descascada, sem proteção e desorientada.

ASPECTOS E CAUSAS

Onde acumula saburra, as papilas filiformes se hipertrofiam por aumento de queratina, formando pelos de até 12mm. Seu aspecto já foi comparado ao de um campo de trigo caído pelo vento. A língua pilosa está associada necessariamente à falta de higiene da língua que pode acontecer quando a redução do atrito com o palato por uma alimentação pastosa, uso de dentaduras e, quase sempre, com o vício do tabaco com fumaça ou de mascar.

Os bochechos não tiram a saburra, que para isto, requer ação mecânica local. O uso apenas de antissépticos a base de perboratos, peróxidos e antibióticos, podem levar ao desequilíbrio da microbiota local, favorecendo a instalação da língua pilosa.

É importante ressaltar que em todas as causas, o elemento primário é a falta de higiene adequada da língua. Isto ocorre em pessoas normais e desatentas para a higiene da língua, mas especialmente em pacientes com dificuldades motoras e nos internados, como os infartados. A saburra e o estado sistêmico facilitam o desequilíbrio da microbiota como nas anemias, distúrbios gastrintestinais e leucemias.

A língua pilosa está presente ainda como efeito colateral de muitos medicamentos como antibióticos, quimioterápicos, ansiolíticos e muitos outros. Em pacientes submetidos a radioterapia oncológica envolvendo a boca, a língua pilosa é frequente.

Em todos os tipos de pacientes, a higiene bucal deficiente é o elemento primário para o desenvolvimento da língua pilosa, no qual também se faz importante o vício de fumar. Os demais fatores locais e sistémicos representam situações em que a higiene bucal ficou deficiente e favorecem que a saburra seja seguida de língua pilosa.

CONDUTAS        

A retomada da higiene lingual elimina a saburra e, às vezes, até as hipertrofias das papilas filiformes. Em alguns casos, os “pelos” devem ser cortados, pois provocam náuseas ao tocar no palato, halitose e disgeusia. A cor varia de branca, amarela, marrom e preta, e está relacionada com pigmentos dos alimentos, drogas, alcatrão do tabaco e presença de bactérias cromogênicas.

Para tratar a língua pilosa, que não é rara, o odontólogo lhe dará todas as orientações e fará as manobras necessárias para o tratamento deste problema. Apenas o uso de bochechos não resolve o problema. É essencial retomar a higiene mecânica da língua, o corte das papilas, o redimensionamento de próteses e a eliminação ou controle das outras causas.

A sua língua tem saburra? A cor normal é rosa esbranquiçada e sem camadas! 

 

Alberto Consolaro - professor titular
pela USP - consolaro@uol.com.br