Hélder Nagai Consolaro – Universidade Federal de Catalão (UFCAT)/Rede
Biota Cerrado
Raphael Matias - Universidade Federal de Jataí (UFJ)/Rede Biota Cerrado
Antônio José Camillo de Aguiar - Universidade de Brasília (UnB)/Rede
Biota Cerrado
Daniel Luís Mascia Vieira – Embrapa Cenargen/Rede Biota Cerrado
A pergunta do título, inicialmente, pode não fazer muito sentido, pois a
polinização parece um termo distante do cotidiano, porém isso não é bem assim.
A polinização é uma das etapas da reprodução das plantas, tal como ocorre no
pequi e na araucária, como também no tomateiro, na laranja e outras espécies
alimentícias. Na polinização da laranjeira, as flores atraem abelhas que irão
se alimentar do néctar e, involuntariamente, acabam polinizando e produzindo
alimento para nós, humanos. A polinização pode ser considerada o passo inicial
na manutenção de um ecossistema e na recuperação de áreas degradadas, como
também uma etapa crucial da segurança alimentar dos seres humanos. É somente
após a polinização que os frutos e/ou sementes são formados e,
consequentemente, ocorrerá a germinação e a formação de uma nova planta. É
importante dizer que 94% das plantas de regiões tropicais são polinizadas por
animais. No Cerrado não é diferente, pois cerca de 80-95% das plantas dependem
de animais para a polinização. Portanto, muito embora a polinização pareça não
nos atingir diretamente, ela traz grandes benefícios à humanidade, pois é dela
que vem grande parte do nosso alimento. Por isso, a polinização é considerada
como um serviço ecossistêmico.
A diversidade de polinizadores nativos impacta nossa agricultura, que
representa a maior porcentagem do PIB do Brasil. Soja, café, laranja, algodão e
feijão, são exemplos de culturas beneficiadas pela polinização por
animais, sobretudo por abelhas nativas. São estimados entre 7% e 40% de
incremento na produção de algumas monoculturas quando a polinização por abelhas
acontece adequadamente. Infelizmente, em monoculturas que o entorno da lavoura
está degradado e os polinizadores são escassos, por exemplo no maracujá, o
produtor tem que contratar mão de obra de pessoas para realizar a polinização
manual das flores. Entretanto, é sabido que na polinização natural, feita por
animais, os frutos são mais saudáveis e comercialmente mais viáveis em 70% das
culturas, gerando mais renda ao produtor e mais alimento para a
população.
75% da polinização de plantas agrícolas é realizada por
insetos, e também por beija-flores e morcegos, os quais são
altamente vulneráveis à degradação ambiental. O Relatório Temático sobre
Polinização, Polinizadores e Produção de Alimentos no Brasil, de
2019, estimou um valor global da polinização entre US$ 235 e US$ 577
bilhões, enquanto no Brasil seria um valor anual de US$ 12 bilhões. Assim, a
perda dos polinizadores no mundo levaria a redução da produção e à elevação dos
preços dos alimentos, o que impactaria a segurança alimentar de milhões de
pessoas, sobretudo das populações mais pobres. Pode ainda levar a uma queda do
sistema imunológico da população, devido a diminuição das vitaminas nas frutas.
O Cerrado se encontra sob grave ameaça, principalmente pela mudança no
uso da terra e perda de habitat, podendo afetar negativamente a produção de
alimentos. Por isso, são relevantes as iniciativas que buscam restabelecer a
diversidade da flora e fauna do bioma para manutenção dos serviços
ecossistêmicos, como aquele realizado pelos polinizadores. Hoje, existe uma
demanda de um bilhão de hectares de áreas degradadas para ser restaurada no
mundo, sendo uma oportunidade para associar os esforços de restauração com o
restabelecimento e fortalecimento de serviços ecossistêmicos. Assim, levar em
consideração os serviços de polinização nas iniciativas de restauração é
fundamental para motivar mudanças nas práticas agrícolas. É sabido que a
presença de polinizadores nativos, a proximidade das lavouras com áreas
preservadas e uma paisagem mais heterogênea aumentam diretamente a
produtividade das culturas e diminui a pressão para o desmatamento. Iniciativas
como as da Rede Biota Cerrado, que engloba vários pesquisadores de diferentes
universidades e institutos de pesquisa, são valiosas e devem ser fomentadas
pelo poder público e privado, uma vez que visam justamente a incorporação da
realidade do Cerrado na busca de soluções sustentáveis ao bem-estar
humano.
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