AGENDA CULTURAL

18.2.24

Dentaduras não causam câncer - Alberto Consolaro

Dentaduras variam quanto a confecção ou manutenção e nenhuma delas tem qualquer relação como causa do câncer bucal

As células se renovam a todo instante, reparando os danos provocados na interação com o ambiente. Batemos, raspamos, sentamo-nos, pressionamos e exigimos fisicamente dos tecidos como na canela, pés e mãos, mas também na boca, nariz, olhos etc.

Os traumatismos não alteram genes, DNA e o metabolismo da proliferação celular. Quando se precisa de um tecido mais rude ou forte para uma função aumentada, ocorrem as respostas adaptativas como a hiperplasia, hipertrofia e metaplasia:

1.Hiperplasia é o aumento do número de células. Quando se usa muito as palmas e as plantas dos pés, aumenta-se a quantidade de células que produzem mais queratina e ficam mais resistentes.

2.Quando a célula não consegue mais proliferar, ela aumenta muito seu tamanho para compensar e suprir a necessidade do momento, como os músculos nos exercícios.

3.O traumatismo pode induzir a mudança da forma e função do tecido. Isto chama metaplasia, uma metamorfose na mesma linhagem tecidual. Se morder muito o lábio, pode aparecer uma mancha branca pelo excesso de queratina para suportar a ação mecânica aumentada.

O traumatismo não gera câncer, ao contrário do que se dizia (opinião) há mais de 60 anos, quando nem se sabia ao certo, como era o núcleo, DNA e os genes. Hoje, isto só tem valor histórico, e nem se fala mais nos centros desenvolvidos e menos ainda, nas publicações da OMS.

SEM CÂNCER

Bem antigamente chegou-se a dizer que os traumatismos das dentaduras provocavam câncer. Que próteses quebradas ou velhas também. Mas, na verdade, cientificamente, não é nada disto. Quando aparecia o câncer na boca, o paciente era fumante ou etilista, e quase sempre a lesão aparecia nas áreas em que a prótese não a protegia destes carcinógenos.

Debaixo da dentadura pode-se ter irritações inflamatórias por traumatismo devido a falta de adaptação de próteses desgastadas pelo uso prolongado, gerando hiperplasias reacionais. Depois de 2 anos, o ideal é refazer, pois desgasta o material e a boca se modifica com os anos.

Ainda debaixo da prótese, podemos ter micoses como a candidose crônica induzida por um fungo que aproveita a região com pouca luz, pouco oxigênio e restos alimentares para proliferarem: é tudo que precisam! O certo é higienizar e deixar a dentadura algumas horas por dia na água, deixando a mucosa “respirando”. A boca precisa descansar, já imaginou usar sapato 24h por dia. Inflama o pé, e a boca também!

SEM RELAÇÃO

Não há nenhum trabalho, em qualquer época ou tipo, que se evidenciou qualquer relação entre dentaduras, quebradas ou não, com o câncer bucal. É importante ressaltar que opinião não é ciência e nem a experiência pessoal. O achismo não tem lugar na ciência. Para ser ciência, tem que ser um trabalho publicado em revista científica conceituada, com metodologia e número de pacientes, controlados e sem opinião.

As causas do câncer bucal são tabaco (inclusive eletrônico), álcool (incluindo os de enxaguantes e todos os tipos de bebidas), HPV, raios solares, substâncias químicas usadas para clarear dentes sem proteger o seu contato com a mucosa bucal, produtos químicos de alimentos como herbicidas, inseticidas, conservantes, hormônios e outros produtos incorporados nos legumes, cereais, carnes etc.

A falta de higiene bucal, de manutenção das próteses com ou sem implantes e as restaurações quebradas, não são causas e nem facilitadoras para o aparecimento do câncer bucal. Vamos ser lógicos: a pessoa que não cuida dos dentes e da boca, é claro que não se importa com os vícios, com a escolha adequada de alimentos e muito menos ainda, com a proteção da mucosa bucal.

REFLEXÃO FINAL

Não dá para conscientizar a higiene da boca, cuidar dos dentes ou trocar a dentadura, com base no medo de ter câncer, pois a ciência não oferece nenhum fundamento para esta afirmação. Cada dia que passa, a média de idade dos pacientes com câncer bucal diminui, atingindo jovens com mais de 35 anos, bom estado dos dentes e da boca como um todo.

Lembrete: o medo afugenta as pessoas e não conscientiza ninguém; quem conscientiza é o conhecimento pleno sobre o assunto, o que nos aproxima da verdade sem mistérios ou ocultismos! 

Alberto Consolaro 

Professor Titular da USP  
FOB de Bauru 

consolaro@uol.com.br    

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