AGENDA CULTURAL

24.10.06

As coisinhas insignificantes

Hélio Consolaro

O poeta Manoel de Barros escreveu:
Tudo aquilo que nossa/ Civilização rejeita, pisa e mija em cima/ Serve para a poesia.

Cidinha Baracat, professora e escritora, acadêmica da Academia Araçatubense de Letras, versejou Fundo de Gaveta, e nela A gente encontra de tudo/ No fundo de uma gaveta . E as rimas em “eta” pululam no poema.

Não existe nada insignificante, nem dias úteis e inúteis, nem animais nocivos, nem mesmo ervas daninhas. Se nasceu, aquela vida tem valor.

Vou escrever dos objetos de nosso dia-a-dia, que usamos e nem notamos a sua importância. Para quem tem à sua disposição muitas xícaras, nem nota como são importantes em nossas vidas, sem elas não levamos o café até a boca. E as colheres e os garfos?

O papel higiênico, de vez em quanto apronta as suas, se vingam de nossa indiferença com ele. Sempre está lá disponível, uma insignificância. Quando falta, cria situações muito embaraçosas, de deixar qualquer pessoa meio maluca.

Desprezo tanto essas sacolas plásticas em que supermercados põem as nossas compras, quando passamos pela caixa, que precisei de uma desesperadamente e não encontrava nada parecido. Que vingança! O Consa à procura de uma abominável sacola poluidora.

Nesta semana, passei por algumas situações de ter a água e faltar o copo, nem que fosse mesmo um de plástico ou cristal da Cica.

Como se compram copos de dúzias, são fabricados em série, não mantemos uma relação afetiva come os objetos que usamos diariamente, principalmente em tempo de produtos descartáveis.

Na sociedade primitiva, cada um fabricava aquilo que usava. Havia uma relação carinhosa entre criador e criatura. Cada objeto tinha personalidade e história.

Hoje, nem a roupa tem o meu jeito, compra-se tudo pronto. Na minha juventude, eu tinha cinco camisas. Três para o trabalho e duas para ver Deus. Até hoje, curto camisas velhas, surradas, gostosas... Até alguém dizer:

- Precisamos fazer uma vaquinha para comprar uma camisa pro Consa!

E os abastados daquela época possuíam mais camisas do que eu, mas não eram tantas, como hoje, com todo esse consumismo, quando a mulher de um governador chegou a ter 400 vestidos, por exemplo. Qual a relação da primeira-dama com sua roupa? Apenas glamourosa.

Transferimos isso para os animais, plantas e pessoas. Quantas vezes fui à Padaria Bandeirante, meio apressado, e nem vejo o rosto da garçonete que me serviu? Como se ela fosse um robô.

A garçonete é uma pessoa como eu, com todos os problemas parecidos com os meus, por que não curtir a presença dela! Todos têm significância, até o diabo.

Nenhum comentário: