AGENDA CULTURAL

2.12.06

Eu falo vôti, véio!

Hélio Consolaro

Amanhã, Araçatuba completará 98 anos. Haverá discursos e tiroteios, mas a cidade não é uma velha senhora, ela mesmo uma cidade menina... Não tem um século, embora possua pouquíssimas árvores. Por aqui, os urubus têm como árvores frondosas edifícios. E bem-te-vis fazem ninhos em semáforo.

Excentricidade? Não, caro leitor. Sintoma de que destruímos a natureza vorazmente. E muitos animais, à busca da sobrevivência, se urbanizaram. Deixe pra lá, porque ninguém vai a uma festa de aniversário pra falar mal do aniversariante.

Confesso, caro leitor, sem nenhum pejo, que sou um provinciano. Nasci em Araçatuba, meus pais também, minhas raízes estão fundas nesta terra, e como a mariposa, fico em torno de suas luzes, assim compôs e cantou Magno Martins, um araçatubense meio esquecido por nós.

Por duas vezes, eu tive oportunidade de abandoná-la, mas pensei bem e voltei atrás em ambas. Não quero ser uma planta fora do lugar, com toda a raiz exposta ao sol. Aqui nasci, cresci, sofri e virei gente. Viajamos, corremos mundo, mas precisamos ter um porto seguro, onde cada um se veja no outro. Assim acontece a identidade cultural.

Araçatuba é o fundão do Estado de São Paulo. Dizem os paulistanos que por aqui o Judas perdeu as meias, porque as botas ficaram em Bauru. Nessa terra há um conservadorismo arraigado, pois a coisa só muda depois de o mundo todo mudar. Araçatuba e região têm todos esses defeitos, mas aqui é o meu lugar. Por esse torrão, sou cidadão do mundo, embora me confesse provinciano.

O lugar e o tempo não existem, eles apenas repercutem em nós, como bumbos eloqüentes. Como canta Moraes Moreira: “A casa era assim ou quase/ A casa já não está mais lá/ Está dentro de mim/ Cantar me lembra o cheiro do jardim”.

O meu jeito de escrever, de fazer humor e ironia, não pega bem em outro lugar. Eu falo “Vôti, veio”! Expressão própria daqui. Se falam também em Três Lagos, Penápolis, Rio Preto... Ótimo, mas a expressão nasceu aqui em Araçatuba. Mas o que significa “Vôti, veio”? É a mesma coisa de “Ô loco, meu!”.

Toda cidade precisa ter sua característica, uma cara só sua, como casal de namorado: o chamego só deles, o apelidinho só dito entre eles, a cultura só dela. E o “Vôti, veio” é um bom começo. Ou você pensa que qualquer cidade tem um croniqueiro diário, meio doido da perna esquerda, como o Consa? Gente louca não nasce em qualquer lugar!

Dos 98 anos de Araçatuba, vivi 58. E ainda escandalizo as pessoas. Quer coisa melhor?! Velha senhora é a vovozinha, viu! Vôti, veio, desse jeito o Napo, o cronista das antiguidades (e dos bons!), vai bater em mim!

Página no Orkut a respeito:
www.orkut.com/Community.aspx?cmm=716355

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