AGENDA CULTURAL

16.12.06

Nem onça!

Hélio Consolaro

Estava muito calor, caro leitor, quando eu transitava pela avenida Brasília. Pensei em tomar uma cerveja Antarctica, não no Bola 7, mas no pólo sul, naquela viagem de ocupação da Antártida que sempre é feita pelos brasileiros, embora soubesse que isso era um sonho irrealizável. Eu não sobreviveria com tanto gelo.

Esperava abrir o semáforo, em vez de filosofar, explorarei ao redor. E vi incoerências dependuradas nos postes: bonequinhos branco, imitando gelo, expostos àquele sol tórrido, cujo modelo foi copiado da internet. Sei que a vida é uma pedra de gelo exposta ao sol, mas o Wilson Marinho não precisava exagerar.

Qual seria o tema daquela decoração? Natal no gelo? Não imagino... O autor de tal proeza não deve ser ninguém ligado à cultura brasileira... Só pensou em enfeitar os postes para estimular o consumo, sem nenhuma ligação com a Araçatuba calorenta.

Dizem que não gostamos da realidade, por isso desejamos outra. Pobres, por exemplo, gostam de coisas glamorosas, por isso são leitores assíduos de coluna social. Quem lê Vidas Secas, de Graciliano Ramos, é intelectual, gente de outra realidade.

Nesse verão, encontrei o diabo de zorba vermelha e chupando manga. Ela estava com sua trouxinha nas costas, subindo a pé a av. Brasília, buscava a rodovia Marechal Rondon, perguntei-lhe:

- Para onde vai?

E ele respondeu, com sua voz rouquenha:

- Eu estava hospedado na casa do Heitor Gomes, O Poeta das Multidões, mas não agüentei. Vou embora! No inferno, está mais fresco! Araçatuba é muito quente!

Como está muito quente, o secretário Wilson Marinho resolveu refrescar a avenida visualmente, colocando nos postes bonecos de neve. É o nosso espírito latino de fugir da realidade.

Que o diabo vai embora de Araçatuba, tudo bem. Há até a expressão: “Vade retro, satanás!”. A fuga do demo da cidade só causa um problema: não temos mais as suas costas largas em quem jogamos a culpa de nossas fraquezas.

Numa mesa de restaurante, alguém contou um caso interessante. Veterinário, filho de Araçatuba, que trabalha no Ibama, no Amazonas, ia doar uma onça para o zoológico municipal Flávio Leite Ribeiro. Quando foi visitar o famoso bosque, mudou de idéia, pois o zoológico estava inadequado para hospedar animais. Moquiço.

Na mesa, estava o vereador Arlindo Araújo que logo gritou:

- Araçatuba não está preparada nem para receber onça! Que dirá o progresso! Eta prefeito!

Alguém sugeriu que o fulano (não vou dizer o nome para não complicar) levasse a onça para casa. E a resposta veio pronta:

- Já tenho uma onça em casa, não quero duas!
Mais gargalhadas.


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