AGENDA CULTURAL

4.7.07

Em cada canto, uma saudade


Hélio Consolaro

Eu gosto de andar pelas periferias das cidades, não só de Araçatuba, andar a pé mesmo, caminhar, porque passear de carro é como viajar de avião, não se vê nada. Já escreveu o poeta Mário Quintana, há pessoas que só pensam em chegar, não curte a viagem.

E se o cidadão for motorista, a preocupação é somente com o trânsito das ruas: não atropelar e nem causar acidente. Na cidade, o bom mesmo é caminhar. Nas estradas, usar ônibus ou carro próprio. Olhar dos lados, admirar a paisagem, curtir a beleza natural. Parar e contemplar.

Dizem os entendidos que andar na avenida Pompeu não é legal, só vale pela amizade que se faz, pelo bate-papo com a companhia, porque não é nada saudável (poluição), além da caminhada ser enjoativa.

Numa de minhas últimas andanças, vi um muro lindeiro à calçada, em casa bem construída, coberto por aquele cipó, com flores alaranjadas, chamado de flor-de-são-joão, que enfeita as cercas nos meses de junho e julho à beira das estradas.

Cipó-de-são-joão é uma planta ornamental que ainda não foi descoberta pelos paisagistas. O dono da casa, com certeza, quis trazer para a sua morada urbana algo da infância rural.

Num terreno baldio, vi um plantio de café, cujos pés ainda estavam pequenos. Iam demorar anos para produzir. Uma plantação imprópria para tão pequena área. Para se ter lucratividade, plantam-se cafeeiros apenas em grandes propriedades. Tal iniciativa só se deve a alguma pessoa idosa, recordando a infância e a juventude.

Meu pai, o Seu Luiz Consolaro (ele gosta de nome e sobrenome) faz do quintal de sua casa um minipomar, uma maquete do sítio em que foi criado na Água Limpa. Às vezes, a água que consome em tal atividade não compensa economicamente, mas com certeza faz a sua terapia diária. Aquelas plantas lhes dão força para continuar vivo.

Também vi uma casa, em região não tão periférica de Araçatuba, que é um bangalô bem característico de zona rural. Aquela construção feita sem orientação de engenheiro ou arquiteto, bem simples, mas tudo numa limpeza e com caiação atualizada. Pintada a cal mesmo. Nenhum sinal de abandono. E na frente um grande jardim, bem caipira, cuja paisagista era uma senhora bem idosa que estava a acariciar as plantas, cuidando delas ao cair da tarde.

Então, caro leitor, jovem. Ainda há muitas pessoas cujos dentes ganharam consistência chupando cana. Também sabem que o leite vendido no supermercado é roubado da vaca.

Tais pessoas até falam ao telefone, mas ainda escrevem cartas. E quando bem de manhã se levantam para varrer a calçada ou até a rua, fazem sua terapia matinal.

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