AGENDA CULTURAL

6.5.09

Um grito angolano


Hélio Consolaro

Os angolanos andam pela Noroeste paulista. E atracou em Araçatuba, passando primeiro por Penápolis, o jovem escritor Ribeiro Tenguna. Participou de algumas reuniões do Grupo Experimental da Academia Araçatubense de Letras, declamando alguns poemas. Ele teve antes militância literária em Angola, país lusófono.
Rapaz de 30 anos (recomendam alguns filósofos que não se publique nada antes dos 40), formado em administração e teologia, é evangélico e comprometido com a libertação de seu povo. Optou por publicar seus dois primeiros livros por editora paulistana, a Biblioteca 24x7, aproveitando a trilha do sucesso de escritores africanos no Brasil, como Mia Couto.
Participei do lançamento dos livros de Tenguna no UniToledo, em março de 2009, já como secretário da Cultura. Lançar dois livros numa só noite não foi uma boa estratégia, ainda mais quando a editora exagera no preço (R$ 41,00, 212 páginas). Quem adquire o livro tem acesso à edição digital pelo site da editora.
Não li ainda o romance A última virgem, comecei pelo segundo Quanto vale a vida do africano, que é do gênero da moda: reportagem com ficção. O escritor angolano denuncia com veemência o sofrimento de seu povo, mas faz mistério com o bilhete deixado pelo Padre Zé ao morrer, escrito numa língua antiga: Khoisan. A busca da tradução salvará o povo angolano da doença marburg.
A médica Sophie Feldmann, que, na sua infância, tinha visto seu pai morrer desse mesmo mal, na Alemanha, na cidade que batizou a doença, é levada pelo destino a Angola, cujo povo estava sendo abatido por ela. Tudo acontece bem no estilo do livro Código Da Vinci, de Dan Brown, publicado em 2003.
A convivência na luta de Sophie e do professor angolano Silvestre Kissari faz pintar um clima de amor entre ambos. Isso ocorre também entre a brasileira Luciele (arqueóloga) e o egípcio Ahmed Osman. O livro termina em longos beijos, bem no estilo das novelas brasileiras.
Esse enredo prende o leitor, mas como se trata de um livro denúncia, Tenguna se torna excessivamente explicativo, catequético, apresentando inclusive um viés evangélico no tratamento da AIDS. Esse engajamento do livro provoca a perda de sua literariedade.
Essa polêmica norteou também o livro brasileiro Sertões, de Euclides da Cunha. Na época de seu lançamento, 1901, muitos o consideram mais uma obra política e sociológica do que literária.
Um lugar-comum do livro é que a personagem resolve escrever um livro no final da história. Ele tem como título nada mais que Quanto vale a vida de um africano. A única novidade neste artifício é que Ribeiro Tenguna faz parte do gênero masculino e a personagem autora é do feminino: Sophie Fieldmann.
Se quiser saber quanto vale a vida de um africano, é só ler o livro.

Um comentário:

Carol Morais disse...

Olá! Adoro o site Por Trás das Letras, e agora, adorei o Blog também.Espero que mantenhamos contato e troquemos experiências dentro do fantástico mundo das Letras!
Abraços, Carolina