Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Araçatuba-SP
O Milton Nascimento, com seus 77 anos, diferente de Chico
Buarque, Caetano Veloso e de Gilberto Gil, não mora à beira-mar. Está alongado
num condomínio de luxo em Juiz de Fora-MG, num estado que não é banhado por
mar. Afinal, é mineiro.
Milton Nascimento está curtindo a sua velhice fora do agito
das grandes capitais, desconectado deste seu tempo, curtindo o passado. Há
muitos velhos assim, é uma opção de vida.
Mas há muitos velhos que transformam o saudosismo numa
reação conservadora e elegem o passado como o tempo ideal. Naquela época, tudo
era bom; hoje, está tudo ruim. Na verdade, a velhice traz problemas para as
pessoas e elas projetam essa postura negativa a seu redor. Suas vidas se
resumem numa frase: "O mundo está perdido".
Anélis Assumpção |
De uma forma genérica, Milton Nascimento durante a
entrevista disse que a música brasileira estava uma merda, conforme matéria da
Folha de São Paulo, edição de 23/09/2019. Chutou um penico cheio.
Os conservadores disseram que Milton Nascimento não perdeu a
lucidez, outros chamaram-no de "velho gagá". A melhor resposta foi a
da filha do saudoso Itamar Assumpção, Anélis Assumpção no Instagram e e
reproduzida pela FSP, cujo trecho está abaixo: “Não fazemos merda, fazemos música”.
"Há, neste Brasil, infinitos artistas enriquecendo a
cultura com novas linguagens, escritas e tecnologia. Há uma música preta,
ocupando um espaço inédito que vai de Rincon a Josyara. Você já ouviu a Josyara
tocar e cantar? E Liniker? Luedji? Percebes que tem muitas compositoras abrindo
uma nova reflexão linguística a partir de seus escritos? É pena uma grande
imensa parte da música brasileira estar à margem, como meu velho pai".
Gagá ou lúcido, continuo gostando das músicas de Milton
Nascimento, mas não precisava jogar todos os músicos na latrina. Não houve
outro jeito, a Anélis teve que dizer dizer que os músicos não fazem merda,
fazem música".
Na verdade, música é boa para uma plateia
é ruim para outra. Não existe dogmaticamente música boa para
todos os brasileiros. Essa é a teoria da diversidade e do pluralismo. A
unanimidade é burra, escreveu Nélson Rodrigues. Como é duro às pessoas
entenderem isso, inclusive ao Milton Nascimento.
Um comentário:
Comentário de meu amigo o englenheiro Luiz Carlos Ribeiro, com consentimento dele:
Acho que estou "Gagá"
Eu entendo tanto de música quanto de turbina de avião, mas também não entendo de música dogmaticamente.
A bem da verdade, logicamente há uma produção de música "boa" no Brasil, nem poderia ser diferente, é da história, coisas "boas" e coisas "ruins". É assim em todas as atividades da humanidade. Bons e ruins "músicos", como bons e "ruins" arquitetos, médicos, comerciantes, e assim por diante. É lógico também que não haja unanimidade, nem poderia ser diferente, é da diversidade humana.
Porém, como dizia Plinio Marcos, "há sempre um porém".
Não da pra descontextualizar a "observação" de Milton Nascimento.
Em épocas, não tão distantes, o mercado fonográfico não era tão "antropofágico" como nos dias de hoje, vai daí que, por este viés, o mercado da música se tornou um "vale tudo".
Em termos quantitativos a profusão de músicas "mal elaboradas" encheu as emissoras de rádio e tv na insana disputa por audiência e representa, indiscutivelmente uma grande maioria. É difícil não concordar com isso.
Há aqui um pressuposto a se levar em consideração, na música, como em qualquer ramo das artes, este não é terreno baldio, é um terreno minimamente exigente. Um terreno que exige "vocação" pra coisa, e o que anda por aí, em maioria, passa longe disso.
Essa discussão me remete a uma das geniais afirmações de Darci Ribeiro quando da proposição da Universidade de Brasília UNB. "A UNB não vai formar Oscares, numa referência a Niemeyer, mas vai permitir que eles apareçam". Pelo mesmo viés do quantitativo o qualitativo.
Hoje o qualitativo, na música, está acachapado pelo quantitativo sem eira nem beira.
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