AGENDA CULTURAL

7.3.22

Sair de casa, construir o futuro

Yuri - 2022
Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Araçatuba-SP

Meu neto Yuri vai estudar fora. Nesta semana, fomos deixá-lo em Três Lagoas-MS. Quis seguir a tradição da família de se livrar dela bem cedo. Empenujou, tem que voar.

Família toda foi deixá-lo em sua nova cidade, todos preocupados. Vai morar sozinho numa quitinete, toda mobiliada, bem diferente do avô Consa que chegou a uma república de estudante com um galo-de-briga (uma trouxa com roupas), sem lenço, mas com todos os documentos, sem dinheiro no bolso e uma valise.

Bem diferente da mãe dele que em 2000,  solteira, foi ser professora efetiva na cidade de Salto-SP, morando numa república de moças. Bem diferente do tio Hélder que em 1998, com os mesmos 17 anos do Yuri, foi morar em Campo Grande-MS, sem ninguém da família para levá-lo pela mão. Já o padrasto Marlon, com 19 anos, voou para mais longe em 1993, Japão. 

Eu, o avô Consa, fui morar em república de estudante em Penápolis para estudar, 1971. Não aguentava mais viajar todas as noites de kombi. Consegui transferência da Divisão Regional Agrícola de Araçatuba, onde eu era escriturário, para a Casa da Agricultura de Penápolis. 

A república era instalada numa casa mais velha e descuidada da cidade, à procura de aluguel baixo, toda mobiliada com móveis e equipamentos usados, cambetas. Final de mês, rateio das despesas. 

Os moradores da república eram filhos de trabalhadores, pequenos sitiantes que tentavam passar pelo mata-burro da faculdade particular. A dificuldade não era passar no vestibular, mas pagar as mensalidades em dia. Todos tinham emprego simples, pois o curso era noturno e não havia filhinho de papai.

Cheguei e me arranchei na república "Solar dos Inocentes" (cada uma tinha nome mais exótico do que o outro: "Pito aceso", "Pica reta") onde havia o cafofo do Manezinho Veríssimo, jovem de São Paulo, curso de Matemática, que estava desocupado, pois havia pego aulas na rede estadual como estudante.

Quando ele voltou para uma visita ao "Solar dos inocentes", me encontrou no seu ex-cafofo, acomodado, fizemos um escambo. Que eu ia fazer com a valise dada de presente pelo meu pai quando comecei a viajar para São Paulo? Como o Manezinho ia transportar a cama, o colchão e a cômoda? Nem ia precisar deles. Fizemos a troca na orelha (sem volta), como se dizia naquela época. 

Assim, os velhos vão repetindo sua história  em seus descendentes, criando uma tradição familiar, assim caminha a humanidade. 

Com certeza, caro leitor, a sua história seja melhor que minha, mas nossas pequenas ações ao serem contadas viram saga. É o milagre de quem é o narrador.  

COMITIVA BOTA-FORA DO YURI EM TRÊS LAGOAS: Vó Helena, mãe Hélen, padrasto Marlon, vó Tieko, irmãs: Luísa, Elis e Caio.     

5 comentários:

HAMILTON BRITO... disse...

Que ele encontre. Felicidade que está logo ali esperando por ele

Aprendendo a aprender disse...

PARABÉNS que Deus continue o abençoando abundantemente!!!

Unknown disse...

Tempo bom ! Na republica " Solar dos Inocentes " não tinhamos geladeira e todos os dias o vizinho colocava 2 formas de gelo sobre o muro.

Web Literatura disse...

Realmente muito interessante a maneira leve e fluída que trata de um assunto tão sério, a independência familiar.

Web Literatura disse...

Interessante o modo como escreve sobre um assunto tão relevante quanto a independência financeira e familiar. Texto muito bem construído, parabéns.