AGENDA CULTURAL

7.4.23

O canto do povo de um lugar - Antônio Luceni

O canto do povo de umlugar – uma leitura das canções de João do Vale” é o mais recente livro do professor universitário e membro da Academia Araçatubense de Letras – AAL, Francisco Antonio Ferreira Tito Damazo, ou simplesmente Tito Damazo, como é mais conhecido.

Resultado de sua tese, o livro já havia sido lançado em 2021 de forma virtual, num bate-papo realizado pela editora que o publicou, Todas as Musas, ainda em meio ao contexto pandêmico a que fomos/estamos submetidos. Mas ficou faltando aquele “gostinho de quero mais” que é próprio do lançamento presencial, com autógrafos, abraços e afetos e tudo mais que faz parte do entusiasmo brasileiro.

 E esse “gostinho” foi sentido no último 24 de fevereiro, na Livraria Vila Sophia, em Araçatuba, em noite concorrida, com as presenças de amigos e familiares do autor, de variados tempos e contextos, sobretudo dos ligados à educação, como é o caso de amigos da rede estadual de ensino e da faculdade de Letras, da Toledo.

O livro é composto de cinco capítulos, sendo eles:

1) A música popular brasileira, onde o autor realiza um percurso histórico e teórico acerca da presença da música popular brasileira e suas contribuições na formação intelectual de nossa gente;

2) A música popular brasileira de João do Vale, em que Damazo situa o compositor/cantor em questão, elucidando as muitas contribuições trazidas por ele para o cancioneiro brasileiro;

 

3) Análise das canções participantes,

4) Análise das canções que valorizam o patrimônio social e cultural do povo daquele lugar e

5) A lira diletante, em que analisa várias canções de João do Vale, entre elas “Carcará”, “Minha história”, “Bom vaqueiro”, “A voz do povo”, “A lavadeira e o lavrador”, “Peba na pimenta”, “Forró do beliscão”, “Estrela miúda”, “Na asa do vento”, “De Teresina a São Luís” e “Maria Filó”.

João do Vale, menos conhecido do grande público, é frequentemente evocado até os dias atuais a partir de vozes mais conhecidas do público geral como Chico Buarque, Maria Bethânia, Fagner, Gilberto Gil, Clara Nunes, Alceu Valença, Zé Ramalho, Ivete Sangalo, Luiz Gonzaga, Alcione, entre outros.

Conforme descrito em uma das orelhas do livro, a pesquisa “... pretende demonstrar que as canções de João do Vale se constituíram numa forma de expressão artística popular de resistência e combate ao arbítrio e à exploração social e política que sobre a população do sertão Nordestino e das periferias das grandes cidades brasileiras se desencadeava como um desígnio. Isto se realiza, de um lado, por meio de canções denunciadoras da perversa situação social em que se encontra e vive esse povo. De outro, por meio de canções que se constituem em defesa da preservação de seus hábitos, costumes e suas manifestações culturais, valores que o identificam com sujeito devida e dignamente situado num espaço”.

Mas o trabalho que o professor Tito Damazo realiza em seu doutorado vai além do conteúdo e das análises feitas por ele, especialmente, com a publicação em forma de livro. Entre outras contribuições, oferta a um sem-número de pessoas (gente do povo, estudantes de música, literatura e poesia, pesquisadores da cultura popular e do cancioneiro brasileiro) uma fonte riquíssima da historiografia musical de nosso país, de personagens brasileiras, por vezes, deixadas no esquecimento, ou mesmo, preteridas por razões outras que não nos cabe aqui discutir neste momento.

Lança luzes para uma questão bastante contemporânea, sobretudo no campo dos estudos culturais, em relação a presença de homens e mulheres negros no que se refere à produção de arte em suas muitas expressões, como poesia, literatura, música, artes visuais, arquitetura, teatro, dança etc. O compromisso de João do Vale em suas canções com o “outro”, com os menos favorecidos e até mesmo injustiçados socialmente é destacado por Damazo, quando diz “... que suas canções impregnadas por forte sentimento de empatia com a causa popular ressumam, de modo geral, denúncias de injustiças sociais, episódios e situações que apresentam essa gente como um povo cordato, trabalhador, crente, alegre, esperançoso, familiar, honesto, apegado à sua terra, apesar de toda sorte de dificuldades e privações a que vivem sujeitos”.

O professor Tito Damazo, por sina ou predileção, acaba por considerar tanto em sua pesquisa de mestrado quanto na de doutorado dois maranhenses. O primeiro no âmbito da academia, da chamada “erudição”, Ferreira Gullar, também publicada em formato de livro (Ferreira Gullar – uma poética do sujo, Nankin, 2006). O segundo, um homem do povo, da chamada “cultura popular”, objeto do presente artigo. Ambos tendo a poesia como foco e como objeto de análise e predileção, certamente pelo pendor – poeta que é, por esse tipo de arte.

Sugerimos vivamente a leitura deste livro não somente para os que gostam de ler e escrever poesia, dos que se sentem envolvidos por música e pela cultura popular, mas também como uma forma de compreensão mais ampliada acerca de si mesmo, da empatia para com o outro, das razões pelas quais buscamos nos encontrar enquanto povo brasileiro.

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Antonio Luceni é escritor, artista visual e arquiteto-urbanista. Doutorando em Artes pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista - Unesp/ Câmpus São Paulo e Mestre em Letras/Estudos Literários pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul - UFMS/ Câmpus Três Lagoas. É professor efetivo, por meio de concurso público, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo - IFSP. Membro da Academia Araçatubense de Letras, ocupando a cadeira nº 15, e da União Brasileira de Escritores - UBE.

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