AGENDA CULTURAL

11.8.24

Um tsunâmi de traumatismos dentários - Alberto Consolaro

Dentes sem protetores estão expostos todos os dias aos traumatismos no lazer e esportes 

Sociedades mais evoluídas deixam ter cárie e doença periodontal pelo seu grau de conscientização quanto a alimentação e higiene bucal. Nestas sociedades, como nos países escandinavos, os principais problemas dentários estão associados a duas situações:

1. Agenesias, um grupo de ausências dentárias chamadas de hipodontia ou anodontia parcial, oligodontia e anodontia total, que afetam até 25% da população ou mais se for considerada a anodontia parcial dos terceiros molares. As pesquisas nestes países, procuram saber quais são os genes responsáveis pela dentição, para que possamos manipulá-los. Ainda se procura, formas inteligentes e acessíveis de restaurar e repor os dentes ausentes.

2. Reabsorções, especialmente as provocadas pelo traumatismo dentário do tipo reabsorção dentária por substituição, que levam à perda do dente. Os outros tipos de reabsorções dentárias, as inflamatórias, também podem levar à perda, mas só quando diagnosticadas em estágio avançado. Quase sempre, elas são restauráveis e o dente volta ao normal.

SUBSTITUIÇÃO?

O traumatismo faz o dente encostar e raspar sua raiz no osso, tirando no local, o ligamento periodontal e a sua rede de Restos Epiteliais de Malassez. O ligamento é uma membrana de 0,25mm de tecido mole que recobre as raízes. Esta rede, libera a substância Fator de Crescimento Epidérmico (EGF) que “umedece” o ligamento periodontal e atua sobre as células ósseas, não deixando o osso encostar e unir-se ao dente, o que se chamaria anquilose.

Se o osso unir ao dente, vai continuar a reabsorver e formar toda hora, o que é seu normal, e neste lugar, vai reabsorver o dente que, em alguns meses ou anos, desaparecerá substituído por osso. Esta reabsorção dentária por dubstituição, uma vez iniciada não tem volta, o dente será perdido ao virar osso!

O traumatismo dentário pode ser uma simples pancada em brincadeiras, lutas socos, tapas e batidas que apenas deixa o dente dolorido por alguns minutos, e isto se chama concussão. Ela pode ocorrer ao abrir garrafas com dentes, ou cortar fios e amassar metais. Pode ser ainda durante uma cirurgia, anestesia geral, enfim qualquer tipo de pancadas.

Muitas vezes o traumatismo deixa o dente com mobilidade maior, quando se chama subluxação ou luxação. Tem casos que o dente sai do alvéolo, ficando na boca ou caindo no chão, o que se chama svulsão parcial e total. Tem casos que dente sofre intrusão no osso. Neste casos fica mais difícil escapar da reabsorção por substituição e futura perda dentária, quando se usará implantes para substituí-los.

TSUNÂMI

Existe um tsunâmi de traumatismos dentários e de reabsorções dentárias. Os brinquedos e os tipos de entretenimento cada vez mais com máquinas e automáticos, incluindo os esportes, expõem muito mais os dentes a traumatismos e suas consequências.

Sempre me baseei nos dados de um trabalho norte-americano de 1993, para informar que a prevalência das reabsorções dentárias era de 7 a 10% em pessoas que nunca fizeram tratamento ortodôntico. Esse mês, participei da banca examinadora da dissertação de mestrado de Rogério N. de Morais Pereira, em Campinas, que revelou um dado preocupante: em 21,7 dos brasileiros, ao menos um dos ápices das raízes dos dentes incisivos superiores e inferiores, tem reabsorção dentária.

É um dado muito elevado e indica que antes de qualquer procedimento odontológico, deve se examinar as raízes em imagens radiográficas periapicais e tomográficas, pois a pessoa pode ter reabsorções dentárias. Elas são sempre assintomáticas, não alteram a cor e nem deixam o dente com mobilidade aumentada. Se descobrir muito tarde, o dente pode estar comprometido e deverá ser extraído. As reabsorções dentárias são traiçoeiras e, quase sempre, são descobertas em exames de rotina.

REFLEXÕES FINAIS

Pacientes e profissionais devem estar mais atentos ainda do que se pensava, pois, a dimensão do problema é muito maior. Existe um tsunâmi de traumatismos e reabsorções dentárias. A prevenção passa: 1. Pelo uso de protetores bucais ao praticar esportes ou outros tipos de lazer, e 2. Procurar o profissional depois de qualquer batida dentária, desde as mais inocentes, até as que amolecem ou tiram o dente do lugar. Como consequências do traumatismo, ainda se tem as fraturas dentárias, as alterações pulpares e contaminações, sem contar as fraturas ósseas associadas.

Seria maravilhoso que todas as escolas executassem programas de conscientização de professores e alunos sobre o que fazer e quais as providências tomar frente aos traumatismos dentários. Seria sonhar demais? 

Alberto Consolaro 

Professor Titular da USP  
FOB de Bauru 

consolaro@uol.com.br 



 

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