AGENDA CULTURAL

1.9.06

Esse coração oculto*

Hélio Consolaro

O Ferreira é Gullar, tem programa no canal do Sesc-SP, mas seu nome se parece com João Goulart, são da mesma época, escreveu “Poema Sujo” no exílio.

O poeta é da terra de José Sarney (Marimbondo de Fogos, brasileiros e brasileiras), de Gonçalves Dias (aquele da palmeira e do sabiá) e Aluísio Azevedo, que saiu de São Luís expulso, porque escrevera O Mulato. Denunciou que lá negro não era gente.

E mais no popular, São Luís é berço de João do Vale de Zeca Baleiro. Maranhão, sim, senhor! Lugar de muito miséria e de muitos poetas também. E praias maravilhosas. Os franceses andaram por lá no Brasil colônia, semearam a literatura.

Acho que o Tito Damazo foi gente por lá, em outras encarnações. No mestrado, Ferreira Gullar; no doutorado, João do Vale. Como gosta dos maranhenses.

Então. Meu amigo Tito Damazo, que foi meu colega de Curso de Letras na faculdade de Penápolis, aliás, doutor Tito Damazo, porque ele é doutor de letras. Eu me enveredei pela superficialidade da mídia, ele enfiou o nariz nos livros e não o tirou mais.

Não sabia, caro leitor? Existe doutor nisso, sim. Escreve aquelas coisas bonitas que não são para entendimento de mãos grossas e calejadas.

Doutor de letras, como aquela placa na rua Silva Jardim: Dr. dos Alicates. Gente sabida num determinado ramo. Mas o Tito é doutor de papel passado. Carimbado e tudo. E para ninguém duvidar, pôs no livro sua dissertação: “Ferreira Gullar – Uma poética do sujo”, com prefácio do próprio poeta, orelha de gente sabida, como Valentim Facioli.

O menino que sujava a roupa mexendo com barro nas cerâmicas de Avanhandava para ganhar a vida, chegou a doutor. Pernas tortas como o Garrincha, loiro como Ademir da Guia, e jogava como o Leivinha.

O menino Tito precisa ir à aldeia mostrar o diploma. E diga lá: “Que me respeitem, sou doutor”. Autografar livro, ser homenageado na Câmara Municipal, porque esse cronista é dela “persona no grata”.

Então, caro leitor, amanhã, sábado, na UniToledo, a partir das 20h, o Tito Damazo, diretor do Departamento de Letras, estará rabiscando o seu livro. Olhando na cara da gente, na espera da fila, e escrevendo uma dedicatória.

E eu, fantasiado de Franklin Roosevelt, ficarei ao lado do Tito, fantasiado de George Washington, dizendo ser seu amigo. Que lecionamos juntos em Rosana, ficamos na mesma cela no DOI-CODI.

E juntos, nossos corações cantarão esta música de Almir Sater: “Para que a gente realize então/ Aquela velha mas sincera ambição/ Conte comigo eu te sigo/ Para enfrentar o castigo/ Ou ter glórias de um campeão”.

* Verso do Poema Sujo, de Ferreira Gullar

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