AGENDA CULTURAL

20.4.07

Tive mais sorte que Dóris Giesse


Hélio Consolaro

“O gato de estimação da ex-apresentadora Doris Giesse, 46 anos, que caiu com ela do 8º andar de seu prédio em São Paulo, saiu ileso da queda.” Quando dois pulam (ou caem) nem sempre têm conseqüências iguais, porque cada um teve uma trajetória. E não adianta ficar acusando o outro:
“Você me enganou, me traiu!” A individualidade, tão desejada e almejada, tem lá suas conseqüências.

“Dóris Giesse disse que sua queda foi parecida com desenho Tom & Jerry.” Na verdade, não se sabe se a ficção imita a vida ou acontece ao contrário. Quem vive no virtual e no real nunca sabe qual está acontecendo. Luisinha, personagem do romance O Primo Basílio, Eça de Queirós, lia muitos livros românticos e quis viver um amor fora do casamento. Não teve a sorte de Dóris Giesse, morreu de amor.

“Chamado de Tigrinho, o animal caiu no colo da apresentadora e não sofreu qualquer lesão.” Sempre é assim, o mais amado é mais protegido, com ele nada acontece, quem ama com a força do romantismo fica mais exposto. Engraçado, seja bicho ou gente, o masculino sempre sai mais ileso. Está provado, as mulheres são mais românticas.

“‘Ele nem teve que passar pelo hospital’, brincou o jornalista Alex Solnik, marido de Doris.” Pimenta no olho do outro, não arde em nós. Como é duro ocupar o lugar do outro. Quem cai sempre é motivo de riso, por isso eu digo sempre que pulei. Essa nossa limitação é frustrante pra quem sofreu o acidente: o outro é o outro, eu sou eu. A solidão humana é tão boa, mas tão doída também...

“Dóris tentava tirar o gato do parapeito quando caiu. O marido e os dois filhos gêmeos da apresentadora não estavam em casa, quando ocorreu o acidente.” Esse gato, não sei não. Aproveitou-se da ausência dos familiares. Deve ter dito: “Se me ama, pule comigo!” Quem brinca com o Cupido não sai ileso, já cantava Bocage. Ele vive pedindo provas. O amor também quebra ossos.

Epa! Dóris caiu ou pulou do 8.º andar? Como gato tem sete vidas, no trajeto da queda, resolveu ser solidário, deve ter dado uma a ela, ficando com apenas seis.

Depois de uma queda, o caído sobrevive ou morre. Como a realidade à minha volta não estava cor-de-rosa, resolvi pular no escuro para buscar a vida, novos mundos, novas experiências, porque o hábito é uma esclerose, tudo protege, mas também tudo envelhece.

Na trajetória da queda, senti braços tentando me segurar, outros, acariciar, mas recebi também pontapés, mas a velocidade da queda era maior que os socorros prestados.

Até que senti algo macio, havia caído num mundo encantado, eram os braços de uma princesa. E não acordei, porque nada era sonho. Tive mais sorte que Dóris Giesse.

2 comentários:

Blog da Joana Paro disse...

Lindo.... lindo... lindo... meu bemmmmm....
Te beijo....

Ventura Picasso disse...

Abriu a guarda companheiro. Quem diria, o velho Consa deixa o sentimento latente revelar um romântico apaixonado! São as pequenas coisas da vida privada de um brasileiro. Afora isso, como sempre, mais uma crônica belíssima. Grande abraço.