Ao longo de 200 anos, os herdeiros da família mineira transmitiram de pais para filhos o dom de contar histórias, colocando seus nomes entre os mais importantes da literatura brasileira
POR IVAN ANGELO
Revista da Cultura - Livraria Cultura
Raras,
mais que isso, raríssimas famílias brasileiras podem se orgulhar de
ter uma penca de escritores pendurada num único tronco, como este que
brotou na região em que se explorava o ouro em Minas Gerais. Falo dos
Guimarães, às vezes Guimaraens. Contando, por alto, foram nove
escritores.
Quando
o primeiro desses Guimarães nasceu em Sabará, em 1777, batizado João
Joaquim da Silva Guimarães, o bandeirante Borba Gato ainda era lembrado
na cidade por velhos contemporâneos. O rapaz, pobre, estudou latim,
por gosto ou por influência (de um pai? Ah, não vamos recuar mais nesta
busca, comecemos aqui...), mudou-se para Vila Rica, terá visto o
Aleijadinho, terá ouvido músicos barrocos nas igrejas, terá sabido
daquele Tiradentes revoltoso, terá visto pendurada na praça a cabeça do
esquartejado (tinha 15 anos), terá sabido daqueles poetas desterrados,
suicidados... João Joaquim progrediu, à força de estudos. Ei-lo
deputado da Província na Assembleia Constituinte do 1º Império, de 1826
a 1829, e, também, poeta e escritor.
Foi
pai de Bernardo, Joaquim Caetano, Manuel Joaquim e duas moças. O
primeiro veio a ser o famoso Bernardo Guimarães, poeta e romancista,
iniciador do regionalismo romântico brasileiro. Manuel, padre e poeta,
morreu no Rio de Janeiro. Joaquim tornou-se jurista, membro do Supremo
Tribunal de Justiça (no Império) e do Supremo Tribunal Federal (na
República). Bernardo não subiu muito na carreira jurídica. Nomeado juiz
em Catalão, Goiás, ao ver a cadeia superlotada e os presos doentes,
libertou-os para se tratar, mas eles não voltaram. Foi destituído,
processado, reconduzido e, mais tarde, depois de peripécias, voltou
para Vila Rica.
Outro
Afonso, primo desses, filho de uma sobrinha de Bernardo, latinizou o
próprio nome e tornou-se Alphonsus de Guimaraens, um dos mais
celebrados poetas simbolistas brasileiros. Apesar da tristeza e do
sentimento de solidão presentes em sua produção poética, tristeza que
se diz nascida do amor pela prima Constança – filha de Bernardo, morta
tuberculosa aos 17 anos –, casou-se e teve 14 filhos. O irmão do pobre
Alphonsus, Arcanjo Augusto, também adotou um nome artístico,
Archangelus Guimaraens, e poetou na linha simbolista. Dos 14 filhos de
Alphonsus, dois tornaram-se escritores, e famosos: Alphonsus de
Guimaraens Filho e João Alphonsus.
João,
contista e romancista, foi daqueles primeiros modernistas de Minas, da
turma de Carlos Drummond de Andrade, Emílio Moura, Cyro dos Anjos,
Pedro Nava, que trabalhavam no jornal Diário de Minas e fundaram A Revista. É autor de um conto que frequenta antologias desde sempre, publicado no livro de mesmo nome, Galinha cega. Seu romance Totônio Pacheco
é listado entre os melhores do modernismo. O irmão, Alphonsus Filho,
poeta da chamada terceira fase do modernismo, ganhou, em 1985, o Prêmio
Jabuti de Poesia, com o livro Nó.
Em
200 anos de história, esses Guimarães/Guimaraens, de graus variados de
parentesco – bisavô, avô, pai, filhos, tios, sobrinhos, netos,
sobrinhos-netos, bisnetos, irmãos, primos – escreveram poemas, contos,
romances, crônicas e artigos. Alguns listados entre os mais importantes
da literatura brasileira. Sem contar os que foram eruditos e
jornalistas destacados, vários deles poetas e ficcionistas inéditos.
Curiosamente, não há mulheres nesse florilégio. ©
Um comentário:
Eu amo um Guimarães...que tal o senhor escrever um texto sobre Grande Sertão - veredas???
Eu amaria ler. rs
(O texto sobre o perfume o senhor está me devendo...ah nemmmmmm!!!rsrs).
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