AGENDA CULTURAL

19.11.12

Benditos feriados!




Hélio Consolaro*

Em novembro de cada ano, levanta-se a tese de que o Brasil possui muitos feriados. Com certeza, não são os sindicatos de trabalhadores que fazem o alarde, mas os patronais. Para quem leu alguma coisa sobre o ócio, sabe que se o trabalho fosse bom, ninguém fugia dele, quem o defende como meio para buscar a dignidade humana são as pessoas em posição de comandar o trabalho alheio.

Durante o feudalismo, monarquia, o trabalho era uma atividade imprópria para os nobres, não dignificava ninguém. Todos aqueles que trabalhavam com as mãos eram desvalorizados. No Ocidente, isso permanece até hoje, pois quem trabalha limpinho, de terno e gravata ainda é mais valorizado do que o trabalho braçal. Veja quanto ganha um lixeiro...

Com o liberalismo, surgiu a máxima: o trabalho dignifica o homem, como forma de combater o ócio do antigo regime, praticado pelos nobres. Há um ditado popular: “O ócio é o pai de todos os vícios”. Na época em que surgiu essa afirmação, o mais prejudicial à sociedade era o avarento, que vivia escondendo o dinheiro no colchão, debaixo da cama, não o pondo para circular. Diferente do poupador moderno que aplica o dinheiro no sistema financeiro. 

Essa pichação de que o Brasil é o campeão de feriados e férias começou com o empresário Antônio Ermírio de Morais, dono de um império, com uma multidão de trabalhadores construindo a riqueza dele. Nessa tese, estão embutidos os interesses patronais.
Conforme a revista Época, entre férias e feriados, países europeus disparam na frente. Brasil está na 6ª posição em férias mais longas e na 8ª em número de feriados. Alguns chegam a dizer descaradamente: “O que querem os pobres com esses feriados? Eles deviam estar trabalhando”. É o espírito da casa grande em relação à senzala que ainda predomina entre nós.

Vivemos numa sociedade cuja civilização é a judaico-cristã, que tem uma política do ócio bem definida: descansar no sétimo dia. Fazer uma reflexão, praticar a contemplação, pôr sua leitura em dia no domingo. Ócios do ofício. Atualmente, há uma ganância de mercado posta em prática de trabalhar até no “Dia do Senhor”.

Além disso, hoje há a indústria cultural, as atividades de turismo, empresas do próprio sistema econômico que lucram com o ócio, precisam dos feriados e das férias dos trabalhadores. O setor comercial, por exemplo, acha que se fecharem as lojas, o dinheiro do consumidor vai sumir. Afinal, o dinheiro é como a água, é a mesma quantidade que está em circulação.

“A noção de que atividade boa é aquela que produz lucro constitui uma completa inversão da ordem das coisas” – afirma o filósofo Bertrand Russell no seu livro “Elogio ao ócio”, Editora Sextante. O lucro no sistema capitalista é um meio, não é um fim em si mesmo. Não se junta dinheiro para ter uma boa aposentadoria, como o avarento, que depois de velho, não sabe se divertir. Precisamos trabalhar e viver bem simultaneamente. A vida é um processo.

*Hélio Consolaro é professor, jornalista, escritor. Atualmente é secretário municipal de Cultura de Araçatuba-SP

Um comentário:

Heitor Gomes disse...

O patrão defendo o dia útil, não é porque ele adora trabalhar, e sim, porque ele precisa produzir para honrar os compromissos. Se os trabalhadores não produzem, não tem como fazer jus ao estipendio. Existe uma grande diferença entre "mostrar serviço" e ser produtivo. O setor publico adora decretar ponto facultativo, porque a procrastinação faz parte dessa cultura de "mostrar serviço". Cada cidadão tem a atividade compatível com sua aptidão. Somente através da produtividade um povo consegue supera suas crises. Amém!