AGENDA CULTURAL

29.8.13

Médicos de boa aparência

Médico negro,cubano, sendo recebido pelos médicos brasileiros

Hélio Consolaro*

Antes de qualquer introdução, desejo dizer que não pretendo generalizar, pois ela é injusta e preconceituosa. Não basta ser médico cubano para ser bom, nem brasileiro para ser ruim. De um lado e de outro, existem bons e maus profissionais.

A mídia tem um caráter generalizante. Basta mostrar alguns focos de violência na cidade do Rio de Janeiro para que consideremos toda a capital fluminense violenta. Não sei se isso é inerente à mídia ou é uma questão ideológica. 
Assim, não podemos julgar todos os médicos por aquilo que aconteceu no aeroporto de Fortaleza – CE.

Na questão dos médicos cubanos, há algumas reações de médicos brasileiros e suas entidades representativas que denotam uma péssima formação humanística. Elas me fazem lembrar o vandalismo dos jogos da 30.ª Intermed (participantes: estudantes de Medicina), que ocorreu em Araçatuba de 2004. Competição que município algum queria sediar porque os nossos futuros médicos danificavam tudo, acolhida pelo então prefeito Maluly Neto.


Não se pode calar os profissionais que são contra o programa “Mais Médicos”, porque a democracia é feita pelo jogo dos contraditórios e todos devem ter liberdade para manifestar, mas precisa haver respeito aos valores universais da humanidade.

Refiro-me a um segmento da categoria dos médicos que é preconceituosa e racista, um braço das forças escravocratas e conservadoras que se sentem dona do Brasil, que mandam neste país desde o seu descobrimento e não admitem que todos os brasileiros vivam dignamente.  Só eles merecem viver. E há um setor da imprensa, tipo revista Veja, que alimenta esses sentimentos negativos.

Chamaram os aviões que trouxeram os médicos cubanos de aviões negreiros, porque neles vêm muitos médicos negros, porque na ilha de Fidel Castro todos têm oportunidade. O sindicato dos médicos organizou um corredor polonês para constranger os médicos cubanos na chegada aos aeroportos brasileiros. Se o regime cubano não é democrático (e eu condeno o regime cubano nisso), tais médicos brasileiros, de formação universitária, se equipararam a Hitler, que queria o arianismo (gente branca é superior) pela força, fez uma guerra para isso, com morte de milhões de pessoas.

Representando esse pensamento desumano, a jornalista Micheline Borges, de Natal, Rio Grande do Norte, escreveu no Facebook, página que foi retirada da internet diante da repercussão negativa, mas que foram copiadas e fotografadas por muitos: “Me perdoem o preconceito, mas essas médicas cubanas de cara de empregada doméstica. Será que são médicas mesmo? Médico geralmente tem boa aparência, se impõe pela postura...” Só porque havia médicas negras entre os profissionais cubanos.


Esse tipo de pensamento de superioridade racial, de exclusão social entre nós, precisa ser combatido com a força da argumentação, não é possível se silenciar diante de tais absurdos. E há muita gente pensando assim que se diz cristão, que venera um Deus que se diz pai de todos, portanto somos todos irmãos, 

independente de qualquer diferença.
Como disse José Simão, cronista da Folha de São Paulo: “Se eu estivesse doente no interior do interior do Ceará, eu queria um médico humano. Tanto faz paulistano, cubando ou marciano”.

*Hélio Consolaro é professor, jornalista, escritor. Secretário municipal de Cultura de Araçatuba-SP


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