A pergunta mais frequente nos bastidores entre os jornalistas que cobrem o poder em Brasília é sobre que posição adotará o Alto Comando do Exército caso o presidente Bolsonaro enverede, como ele sonha, para uma aventura autoritária em busca de poderes que a Constituição não concede.
Militares com voz de comando nas Forças Armadas têm repetido, até com certa insistência, que os demônios golpistas foram exorcizados pelos 36 anos que separam a ditadura da democracia, e que a conjuntura nacional e o mundo globalizado não deixam brechas para quarteladas. O problema, no entanto, é Bolsonaro, que ameaça a democracia ao estimular seus seguidores a pedirem intervenção militar.
O tom das ameaças está sendo elevado agora pelas investigações de uma CPI que tem demonstrado que a desastrada gestão da pandemia está caindo na conta dos militares – como ficou claro no desempenho do ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, um general da ativa.
A constatação de que os oficiais acataram as ordens absurdas de produzir cloroquina a rodo produzirá reflexos ainda mais negativos na imagem do Exército. Por outro lado, caso a CPI acabe desengavetando um pedido de impeachment – remédio amargo, mas legal –, este será um grande teste para vermos até onde vai, concretamente, o compromisso dos militares com a Constituição.
Encabeçado por um capitão e um general eleitos, o governo Bolsonaro tem mais militares em cargos públicos do que a ditadura. Seu aceno à tropa começou com a nomeação de um militar para o Ministério da Defesa, quebrando a tradição de dar tratamento civil ao comando da pasta. Depois, levou generais para os principais cargos de primeiro escalão no Palácio do Planalto.
O Ministério da Saúde, epicentro da crise, é o retrato perfeito. Antes de Bolsonaro, havia um militar em cargo de confiança. Na gestão de Pazuello, aumentou para 30. Na Esplanada, 10 dos 21 ministros são militares. Os cargos de confiança sob controle do Palácio do Planalto mais que triplicaram desde o governo Dilma Rousseff: eram 102 e agora são 343. O levantamento mais completo, divulgado nesta terça-feira pelo cientista político William Nozaki, do Fórum Nacional de Carreiras Públicas de Estado (Fonatec), mostra que já são 6.157 os militares em cargos civis, espalhados por ministérios e estatais.
As mudanças na fisionomia administrativa do governo federal mostram que os militares representam o segmento mais bem distribuído em funções estratégicas e mais bem aquinhoado na máquina federal, algo inédito na história republicana. Eles estão em toda parte, à exceção do Banco Central, da Advocacia Geral da União e do Itamaraty. Sem falar que, desde a reforma da Previdência, as Forças Armadas têm conquistado os melhores ganhos em remuneração na máquina pública.
Como o presidente e seu vice têm origem na caserna, eles não veem nada de anormal em buscar mão de obra qualificada no meio militar. Mas a questão é o que os militares andam fazendo no governo. Se a métrica for o desempenho de Pazuello na Saúde, cai por terra todo o mito que se construiu sobre a capacidade de gestão militar em funções antes ocupadas por civis. Considerando o conjunto do governo, então, ainda está faltando notícia sobre o que melhorou na máquina pública ou nos serviços prestados à população.
Diferentemente de seus antecessores, o que Bolsonaro faz é o uso político consentido do estamento militar para tentar tutelar os outros poderes, especialmente o Supremo Tribunal Federal. As ameaças até agora não surtiram efeito, graças à resistência imposta pelo judiciário, pelo legislativo, e pela parte mais forte do núcleo militar das três Forças, como ficou demonstrado recentemente na demissão dos comandantes.
Em 30 meses, ficou claro que, embora híbrido pela presença de representantes da velha política acomodados no centrão, este é um governo fortemente militarizado, com o qual o presidente acha que está blindado contra eventuais investidas sobre seu mandato.
Na prática, Bolsonaro não tem um projeto para o país. Sua meta é o poder pelo poder, nem que para isso tenha de mergulhar, como mergulhou, no toma-lá-dá-cá do submundo político. Impulsionada pelas investigações da CPI, a probabilidade de mudança na atual conjuntura política exigirá das Forças Armadas um claro sinal da neutralidade em questões políticas – princípio tantas vezes repetido pelos comandantes, mas que raramente se revela na prática.
Um comentário:
É lógico que vou Presidente Bolsonaro, não tem projetos.
E poderia ter?
O Brasil é fruto da corrupção sistêmica.
O Presidente , para sobreviver e para pelo menos , inaugurar projetos inacabados pelos
Postar um comentário