AGENDA CULTURAL

22.4.22

Espetáculo brochante - Antônio Reis

É brochante o espetáculo circense protagonizado por machões que se julgam donos do pedaço. “Nós somos da Pátria a guarda, fiéis soldados por ela amados/Nas cores da nossa farda, rebrilha a glória, fulge a vitória”. Além de cafona, é falaciosa, vez que não amo soldado nenhum e não tenho Pátria. Tenho Mátria.

É de perder a libido saber que “os donos do pedaço” se apossam de R$ 90 mil do dinheiro público para a compra de Viagra e miram a aquisição de 60 próteses penianas pela bagatela de R$ 3,5 milhões. É tamanha a cara de peroba, que nem sequer dissimulam mais o desejo de copular com o país. Copular, não. Foder mesmo.

Não há clareza se a vida imita a arte ou a arte imita a vida.

Desconfio, porém, que por capricho ou desdém com assuntos sérios, irresponsáveis copiam para a vida real uma peça de ficção, seja comédia ou drama. O Viagra e as próteses penianas bem poderiam ser um capítulo do romance “Pantaleón e as Visitadoras”, de Mario Vargas Llosa, lançado em 1973. 

A obra do Nobel de Literatura descreve a missão de “suma importância” do capitão do Exército peruano, Pantaleón Pantoja. Atenção para a patente do militar peruano: capitão (ah, como arte e vida são cúmplices nas coincidências). Ele ficou encarregado de organizar um grupo de meninas para satisfazer os homens do Exército do país andino, para que cessassem os estupros de mulheres na Amazônia peruana. Llosa, no entanto, não deixa claro se os militares poupavam “as feias que não mereciam ser estupradas”.

Pantaleón Pantoja, o Pantita para os íntimos, inclusive para as meninas que arrebanhou, era um militar cdf, filho e marido exemplar, um homem de bem. As meninas receberam o apelido de “visitadoras” pelo delivery para a soldadesca. Daí o nome do romance. O realismo fantástico e debochado de Vargas Llosa se passa no Peru, mas poderia ser em qualquer outro país da América Latina, até mesmo onde se gasta dinheiro público para socorrer milico brocha.

Fardado fora da caserna e com missões tentadoras faz caca, como um general brasileiro especialista em logística, que confundiu Amazonas com Amapá e mandou para o segundo medicamentos que deveriam ir para o primeiro. Cafetão e cafetina, por exemplo, não devem se envolver emocionalmente com suas “operárias”. É a política de todo puteiro não “confundir as coisas”, mas Pantita não resistiu, se enrabichou com a mais bela das visitadoras e foi à ruína. O romance reafirma o dito popular: “Cada macaco no seu galho”.  


(*) Antônio Soares dos Reis é jornalista em Araçatuba e voluntário do Grupo Experimental (GE) da Academia Araçatubense de Letras (AAL
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