AGENDA CULTURAL

4.1.07

O velho Albino

Hélio Consolaro

Não sei que falar de meu avô Albino. Tudo me chegou pelas vozes de meus pais. E não foi coisa boa. Talvez, tudo chegara deturpado. As visões são muito pessoais. Que ele era um sem-graça, isso eu confirmo, pois algum agrado que eu tenha recebido das bandas da Água Limpa veio pelas mãos da avó Margarida.

Deus diz que, no fundo, todas as pessoas são boas, pois as conhecem de todos os lados. O diabo vem e desdiz: todas as pessoas são más por natureza.

Também fico em dúvida. Não sei se Deus disse aquilo que o diabo afirmou ou foi o diabo que afirmou o que o Deus disse. Como são os dois lados da mesma moeda, não vou me preocupar com isso.

Conheço meu avô pelo meu pai. Confesso que há incompatibilidade de gênio entre nós. Se a parte ruim dele foi herdada do avô Albino, aquele velho magro, alto que andava pelas ruas de Araçatuba com uma lata envolta num saco branco, vendendo queijo e requeijão, o cara não era boa bisca.

Não sei se é demagogia feminista, mas o lado bom de cada homem sempre foi herdado da mãe e das avós. Como me levantei num bom estado de espírito, com “uma vontade danada de mandar flores ao delegado/ De bater na porta do vizinho e desejar bom-dia/ De beijar o português da padaria...”, quero recuperar aquela imagem boa do velho, o seu lado obscuro, descobrir o que ia em seu coração.

Missão impossível, porque ele era caladão, não ficava a desabafar com qualquer um, nem que fosse com a esposa ou os filhos. Não soube também se teve amantes para entrevistá-las, porque essas mulheres desclassificadas, rejeitadas, conhecem o lado verdadeiro dos homens.

Só sei que ele era um sujeito que não quis estudar os filhos, porque não queria ser passado para trás por eles. Prendeu-os , deu-lhes uma educação repressora, só os queria para trabalhar na roça. Para se casar, meu pai precisou se rebelar. Esse é o estereótipo que me foi apresentado de meu avô Albino Consolaro.

Na verdade, caro leitor, não estou procurando resgatar a imagem do velho Albino, mas me conhecer melhor. Sei que foi honestíssimo, nunca deixou de pagar ninguém e nos ensinou que o melhor capital de um pobre é o seu nome limpo. Uma coisa bem burguesa, mas que cumpro à risca.

Também de que adianta resgatar uma imagem que ficou nas dobras do tempo. Olho-me no espelho e o vejo, a cada dia que envelheço. Meu pai, com seus 78 anos, tem o jeitão dele, caladão, não abre seu coração com ninguém.

Se sou pedacinhos do velho Albino e de Luiz Consolaro, não são tão maus assim. Afinal, eu gosto de mim, sou a melhor das criaturas. Se alguém não gostar, vá chutar lata, sou assim e não vou mudar. E viva o Consa!

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