AGENDA CULTURAL

11.4.07

Ufa! A Quaresma acabou!


Hélio Consolaro

A crônica de hoje, caro leitor, é destinada aos coroas curtidos pelo saudosismo. Vou dar um arremedo de como era a Quaresma e a Semana Santa.

Na minha infância, as crianças não gostavam da Quaresma, pois não entendiam o motivo de tanta tristeza. Quaresma, jejum e penitência eram palavras assustadoras.

Hoje, a criançada nem sabe bem o que são essas coisas. Ainda bem, porque Deus não quer tanto sofrimento e repressão de suas criaturas. Deus era apresentado como um cara ruim para justificar a ruindade dos donos do poder da época.

Na Quaresma, tudo era feio e pecado. E as crianças queriam explicações sobre o porquê daquilo tudo, mas não davam. Hoje, elas são mais espertas porque têm acesso às informações, se educam na liberdade. Nem os adultos sabiam a razão de tudo aquilo, faziam por repetição, por tradição e porque o padre mandava.

Não podia vestir vermelho, cantar, gritar nem participar das loucas correrias com os primos nos grandes quintais dos sítios, nem podia comer carne nas quartas e sextas feiras.

Domingo de Ramos era o começo da semana “braba”, fúnebre, porque parecia que havia morrido alguém da família. Todos corriam à Missa para benzer as palmas. Benziam-se as folhas da palmeira e depois as distribuíam para as pessoas que não puderam ir à Missa.

A partir da Quinta-Feira Santa, não se cortava lenha. Não se carregava água na cabeça, nem ligava bomba de poço. A rádio só tocava músicas fúnebres. Varrer a casa, nem pensar. Não se lavava a cabeça. Não fumava. Beber pinga, nem se pensava, até os bêbados respeitavam a regra.

Tiravam-se as cordas da viola e pendurava-as na parede, enrolada num pano roxo (até sábado à noite). Não se trabalhava na roça, feriadão triste, sem alegria.

Na Sexta-Feira Santa, jejuava-se até o almoço, quando se comia o peixe e a verdura. Quando não havia peixe, servia-se mandioca. Os mais aquinhoados faziam bacalhoada. À noite, iam todos à procissão do Senhor Morto.

As mulheres começavam a preparar o almoço de domingo na quinta-feira até meio-dia, continuando no sábado depois das 12h.

No Sábado da Aleluia, depois do meio-dia, malhava-se o Judas. E a rapaziada, no sábado à noite, aprontava na estrada, atravessando paus, cordas. Botando fogo em mourões de porteiras das propriedades vizinhas. E também iam roubar galinhas na vizinhança para o almoço de domingo. Sábado era dia de uma bagunça permitida, que fazia parte do ritual.

E hoje? A Semana Santa é um feriadão com muito chocolate. A Quaresma acabou, ficou aquartelada nas igrejas. A sociedade é plurirreligiosa. Ainda bem!




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