AGENDA CULTURAL

30.12.07

Feliz prisão em 2008


Hélio Consolaro

Uma leitora me pediu para escrever sobre a liberdade provisória concedida aos presidiários para que passem Natal e ano-novo com suas famílias.

Mandou até uma frase: “O indulto é um insulto”. Talvez seja de algum locutor de programa policial, que nem sabe realmente o significado da palavra indulto.

Relutei. Assunto mais macabro para momento tão festivo, mas um recado deixado na minha página do Orkut pelo amigo Leonardo Concon me salvou de assunto tão chato, pois me dotou de outro olhar. Não sei, caro leitor, quem é mais livre, os soltos ou os presos.

O mesmo dilema foi posto no conto O Alienista, de Machado de Assis. De repente, o protagonista Simão Bacamarte não sabia mais quem eram os verdadeiros loucos, os internos da Casa Verde ou a população que morava em suas casas.

Depois que vi o poeta Manoel de Barros se fechar numa sala para escrever seus poemas, alegando que assim ficaria mais livre, me pergunto que muros tolherão a minha liberdade.

Em vez de usar um lugar-comum e lhe desejar, caro leitor, próspero ano novo, pergunto-lhe: Que prisão escolheu viver em 2008?

Segundo o psiquiatra Paulo Rebelato, o máximo de liberdade que o ser humano pode aspirar é escolher a sua prisão, pois a liberdade é uma abstração.

As grades douradas nos dão a falsa sensação de liberdade. Diga qual é a sua tribo e eu lhe direi qual é a sua cela. E neste caso não haverá liberdade provisória em datas especiais.

Claro, são celas melhores do que os presídios: pode pegar sol, ler, receber amigos, andar pelas ruas, comer bons pratos, ouvir música...

O casamento é uma prisão. A paternidade, a pena máxima. Um emprego com gordo salário vai impedir a pessoa de arriscar novos vôos. Tudo o que dá segurança ao mesmo tempo escraviza.
Como vivo na mesma casa por 26 anos, já completei 34 de casado, tenho 36 de magistério e escrevo crônicas diariamente há 14 anos, a minha prisão é a rotina. Gosto dela. Não sei se em 2008 pintará cela nova.

Você decide, caro leitor! Quando será capturado, e para onde quer ser levado. Feliz Ano Novo. Feliz cela (nova?).

2 comentários:

Anônimo disse...

Belo texto. Parabéns. Só você mesmo para escrever isso ( o que a gente ou pelo menos eu realmente penso). Acabei de sair de uma prisão de segurança máxima (o casamento), e nunca me senti tão presa, tão acorrentada às minhas lembranças (boas ou não), tão sem rumo,tão só. Antes aquela prisão, pois me dava mais liberdade que agora. Hoje me sinto como um passarinho que foi preso a vida toda e agora livre não sabe mais voar.

Anônimo disse...

Muito bom seu texto, nos faz refletir sobre o que é estar preso o que é estar livre. Acho que no final das contas o que vale mesmo é estarmos bem em nossa cela.