
Hélio Consolaro
Recebi telefonema de minha amiga Elisabeth Nery, colega de magistério. Na década de 80, lecionamos juntos na escola estadual prof. Genésio de Assis. Além de querer saber o estado de saúde da Japa, comentou sobre meus escritos nesta Folha.
Disse que pensava me conhecer, mas a cada dia eu a surpreendo. Às vezes, segundo Beth, estou uma fera no Ponto Cego, mas na crônica de domingo viro um doce caramelado, como “Valorizar o matagal”, no último domingo. E poderia acrescentar: promove a maior bagunça no sábado, na crônica do boteco Bate Forte.
Outro dia, meu amigo me cobrou tenência:
- Como é, você é contra ou a favor do Malulão? Mete o pau, de repente, elogia o “home”. Que rolo!
Nem contra, nem a favor. Não gosto da arrogância. Este croniqueiro é uma pessoa sem convicção, um barco sem âncora que navega ao sabor das águas. A vida vai me levando, até chegar à loca e desaparecer. A coerência não é meu pelourinho. Como a personagem do conto “A terceira margem do rio”, de Guimarães Rosa, não faço muita questão de chegar às margens.
Os valores universais e os direitos humanos são meus catecismos, porque me amo. Tenho fé, busco a serenidade pelo ceticismo. Não escrevo com as vísceras.
A Beth me conheceu quando eu me orgulhava de ser um idealista; como Dom Quixote, queria consertar o mundo. Já descobri que o mundo me consertou, então, caminhemos.
Escrevo porque preciso, necessidade psíquica e financeira, é por onde me realizo na vida. Sou até “ghost writer”. Nos textos encomendados, não ponho o meu nome. Apenas alugo o meu cérebro e minha experiência, pasteurizo-me.
Não venha me dizer no futuro que eu tinha várias personalidades, não invejo Fernando Pessoa. Sou mais Rainer Maria Rilke: escrever me faz falta.
Machado de Assis escrevia para viver, superou seus problemas manuseando a caneta. Graciliano Ramos, no fim da vida, se arrependeu de ter passado os dias espremendo a vista nos livros.
Não sou nenhum deles, sei de minha insignificância. Se tivesse sido sitiante, roceiro ou coisa parecida, teria também cumprido meus dias, sempre faço a fogueira com a lenha disponível, não corro atrás da mulher ideal.
Estou bem, caro leitor, não se assuste. Não estou à beira do abismo. Sorrio, gosto das pessoas, tenho amigos e, apesar da idade, alimento projetos para o futuro.
Escrevi, primeiro, para ser reconhecido, validado. Depois, para fazer proselitismo. Agora, escrevo por hábito, e agradeço os leitores e as pessoas por me tolerarem. Pelas linhas de meus textos, caminho sorridente.
Um comentário:
Adorei essa crônica, me faz sentir em Araçatuba...
Ótimo dia pra ti^^
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