AGENDA CULTURAL

19.4.08

Estranho enterro


Hélio Consolaro

O boteco Bate Forte estava repleto de barrigudinhos no Dia Nacional da Cerveja. Faca Amolada e Caneta Louca corriam as mesas e atendiam aos pedidos que vinham aos gritos:

- Uma cerva bem gelada!

- Espetinhos de filé miau!

E assim o japonês churrasqueiro ficava alegre com a chuva de pedidos de seu produto:

- Bom, né! Garantido...

Dona Assunta, a esposa, cuidava da cozinha. Amelinha, a filha, administrava o caixa, onde mais passava cartão de crédito do que recebia.

Antes de qualquer coisa, a primeira golada era do santo, o Onofre, padroeiro dos bebuns. Aquele que seria o padroeiro de Araçatuba, mas foi substituído:

- Também, disse Bicho Grilo, Araçatuba era um grande ponto de parada dos homens sós. Aqui encontravam carinho e amor das mulheres de aluguel...

- Isso quer dizer que Araçatuba começou como se fosse uma zona de meretrício? – perguntou Magrão.

- Sim – respondeu Bicho Grilo.

- Agora as autoridades querem esconder as coitadas, sendo que estão na raiz de nossa história. Há nome de rua com alguma delas? – quis saber Subversivo.

Dr. Duas Caras entrou na conversa:

- Se nem as mulheres da morte davam nome a ruas, imagine se iam homenagear mulheres da vida!

E todos riram. Quando todos os barrigudinhos foram à porta, passava pela rua do Bate Forte um estranho velório. Primeiro vinha um caixão preto. Depois, um segundo caixão preto. Em seguida, um homem sozinho levando um pitibul na coleira. Finalmente, atrás dele, uma longa fila indiana só de homens.

- Que estranho! – exclamou baixinho Banguelo.

No concorrente, o Bate Fraco, a curiosidade não era menor. Banguelo saiu do boteco, foi para o meio da rua. E perguntou ao homem do cachorro, baixinho:

- Parentes?

- Sim – respondeu o homem do cachorro.

- Meus sentimentos por sua perda... Eu sei que o momento não é apropriado, mas eu nunca vi um enterro assim.. O senhor poderia me dizer quem faleceu?

- Bem... No primeiro caixão está a minha esposa.
- Puxa! Sinto muito! O que aconteceu com ela?
- Este meu cachorro... Ele a atacou.
- Nossa que tragédia! E o segundo caixão?
- Está minha sogra... Ela tentou salvar a filha...

Fez-se um silêncio consternado. Os dois olharam-se nos olhos, criou-se uma cumplicidade entre eles, e:

- Me empresta o cachorro?

- Entra na fila!

Com essa resposta, a conversa voltou a ser animada no Bate Forte. O enterro passou, e a conversa girou em torno do Dia da Sogra, 28 de abril. E não houve rodada por conta da casa, já que não havia sogras no bar, o contraditório ficou prejudicado.

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