AGENDA CULTURAL

4.10.08

Que apelação!


Hélio Consolaro

O boteco Bate Forte estava lotado de barrigudinhos nesta sexta-feira, Dia Nacional da Cerveja. Faca Amolada e Caneta Louca corriam, esbaforidos, atendendo aos pedidos que vinham aos gritos:

- Uma cerva bem gelada!

O primeiro gole era sempre do Santo, o Onofre, que lá de cima de seu nicho observava indiferente as pantomimas humanas. Até que chegou o Dr. Duas Caras. Sentou-se a sua mesa costumeira.

Afrouxou a grava, pôs o paletó no espaldar da cadeira, passou as duas mãos pela cabeça, ajeitando o cabelo lotado de gel. Deu um piparote no ar, Faca Amolada lhe trouxe duas cervejas: uma clara e uma escura, que foram tomadas à carioca.

Magrão chegou e lhe fez uma pergunta:

- Que o senhor achou da campanha eleitoral?

A resposta veio moderada, bem reflexiva:

- Como todas as outras. Os familiares de cada um se tornaram conhecidos. E como Lula deu certo: todos fizeram questão de revelar a pobreza de suas vidas.

Pá de cá, pá de lá. Palmeiras, Corinthians, São Paulo, Santos. Desclassificação do Tigrão. Dr. Duas Caras já estava na terceira rodada de cerva. Vermelho, veias do pescoço estufadas. Magrão fez-lhe novamente a pergunta. A resposta dessa vez veio navegando em cerveja, meio desgovernada:

- Esta campanha foi uma pouca vergonha. Houve um candidato que pôs a ex-prefeita para desfilar na sua carreata. Coitada! Octogenária, várias pontes de safena e exposta ao sol do meio-dia!

Subversivo gritou:

- Muito bem!

Duas Caras respondeu:

- Não sou candidato!

E continuou:

- Teve até candidato a vereador que pôs deficiente físico no programa eleitoral, dizendo: "Eu voto n..., vote você também!" Que apelação! Baixaria. Outro aparece com o filho no colo em outdoor! O Comdica não viu isso?

Miltão, desempregado, mal-humorado, com o dedo em riste, disse:

- Cale a boca, velho bêbado!

E levantou o advogado pelos colarinhos.

Os barrigudinhos saíram em socorro do Dr. Duas Caras. E o pau quebrou. Cadeiras voaram, gritos, pega, pára. Até que o Faca Amolada subiu numa cadeira:

- Cacete! Pare com isso! Rodada por conta da casa!

A bagunça parou. E os copos foram cheios, mas Caneta Louca trabalhava às escondidas...

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