AGENDA CULTURAL

9.4.11

O outro não é meu inimigo - tragédia do Rio de Janeiro


Hélio Consolaro*

Não usarei metáforas, nem ironias. Vou direto ao assunto, quem sabe as pessoas me entendem. Também não tenho a solução dos problemas, nem quero consertar o mundo. Quero apenas nesta janela dizer aos outros como vejo os fatos.

O Rio de Janeiro viveu mais uma tragédia. Dessa vez, o particular invadiu o público: uma tragédia familiar derrama-se sobre o coletivo;  enquanto nas enchentes o público invadiu o particular: um erro na ocupação do solo, causou tragédias familiares. A humanidade paspalha, se pergunta: Por quê.

Sempre digo que a família, em seus vários formatos, é indispensável à formação da pessoa. Não é lição de conservadorismo, s evidências são incontestáveis. Por favor,  não coloquemos a culpa das desgraças em pais separados. Criar filhos assim não é uma situação confortável, mas a separação de casais não pode ser o bode expiatório de todos os problemas.

O grupo familiar é indispensável, é uma fábrica de gente, que tanto pode produzir pessoas boas como cheias de defeitos. Há famílias que produzem filhos com defeitos em série. Quem já lecionou para crianças e adolescentes conhece essas incidências. Outro fator: a irresponsabilidade de pôr filhos no mundo sem arcar com o ônus de tê-los é outro fator de desequilíbrio.

A sociedade também fabrica bandidos e loucos. Wellington Menezes de Oliveira é fruto de sua família, da sociedade, pois se sentia rejeitado, inclusive pelas meninas. Sempre digo que a rejeição é a maior produtora de ódio. Numa hora, ela se manifesta numa ação violenta.

Às vezes, temos a pretensão medíocre de querer apontar soluções para tudo, sem contar com o imponderável, o inusitado. Outro fator de mediocridade é exigir segurança:

- Precisamos ter segurança? Cadê o governo?    

Há gente querendo pôr detector de metais nas entradas das escolas.
Daqui a pouco quereremos andar dentro de uma redoma ambulante. Aliás, já andamos, o carro, mas ele tromba,  bate,  capota! Realmente, não temos segurança.

Outros desejam proibir tudo. Assim, chegaremos a um momento que se faz o último decreto:

- É proibido respirar!
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Alguns desejam um policial  ao lado  de cada  cidadão, então gritam desesperadamente:

- Polícia! Mais polícia! Cadeia neles!

De repente, o bandido é o policial. É  o filho que mata  os pais. O animador de programa policial que é o fdp.  

De  repente o pai é pedófilo. A mãe que  joga  o filho na parede.

De repente, o bandido é o marido. A ladra é a esposa.

De repente, o mau caráter sou eu...

O bandido pode ser o diretor, o professor, o servente, o aluno. O  guarda que é posto na porta da escola para fazer a vistoria de detecção de metais. O bandido mora  dentro da gente, convive conosco todos os dias.

Cerca elétrica, alarmes, muros altos, fortalezas não fornecem segurança para ninguém. Aliás, eles são sintomas de nossa insegurança diante do mundo, de nossa incapacidade de compreender o universo em que vivemos.

A partir do momento em que nós saímos do  útero da mãe,  perdemos toda  a segurança.  Basta  nascer para perdê-la.   Aliás, nem sei se o útero é tão seguro... Morrer é a coisa  mais segura do mundo.

O outro não é nosso inimigo, ele é nosso irmão, filho do mesmo Deus ou do Universo, como preferir, respiramos o mesmo ar. Se for ateu, o outro é meu semelhante, pertencemos à mesma espécie.

A violência de cada dia, aqueles pequeninos atos que nem sentimos ao praticá-los, mas que tanto repercutem no outro. Se há quem pense em mim, vou me preocupar com os outros.   

Parece piegas: Deus por todos, e todos por um. “Deus por todos, e cada por si” é a essência do egoísmo, é privatizar o público. Podemos torcer o nariz para essa verdade, mas ela berra no jornal de cada dia.

 *Hélio Consolaro é professor, jornalista, escritor. Membro da Academia Araçatubense de Letras e da UBE. Atualmente é secretário da Cultura de Araçatuba.

5 comentários:

Nenê Soliani disse...

Que texto impecável! Quanta lucidez! Parabéns!
Nenê Soliani

a voz do dono disse...

Seu texto é brilhante. Um soco no estômago e na mente de cada um de nós. Continue assim, com luz e fé.

Unknown disse...

muitoo.. bom ..ex prof... sempre com excelentes.. palavras.. eh bem isso...

Anônimo disse...

Não gostei. Fraco.

NATAL LUIZ SBRANA disse...

amigo Consa: para mim, ler os seus textos é mergulhar em uma análise profunda, pois, cada frase vivencia uma realidade. Parabens.