Hélio Consolaro
Diante da vulnerabilidade do casamento e o desaparecimento da famosa Casas das Noivas, a palavra “noivas” e “noivos” estão mesmo sem significados. Quando a moça é recatada, o noivado é comemorado no motel, com direito a champanha. Usar a aliança no dedo esquerdo é tão démodé quanto calçar galocha em dias de chuva.
Aquele negócio de os noivos saírem da igreja, com latas amarradas num carro, porque iam fazer lua-de-mel em Poços de Caldas-MG, já era. Aliás, aquela cidade está diversificando o seu turismo. Não se vai mais ao casamento, como se fosse para a forca. Hoje, é apenas uma prisão preventiva, pode ser relaxada.
Não existe coisa tão teatral do que uma cerimônia de casamento, até os presbíteros sabem disso. Como padrinho, este croniqueiro fez uma dívida nas Casas Bahia: comprou a geladeira. Na última prestação, o casal já estava separado. Quase a pedi de volta.
Uma filha grávida fora do casamento não casa mais na marra, nem é jogada na rua da amargura, como faziam certos pais antigamente. O rapaz não rouba mais a moça à noite da casa dos pais turrões. “Casou fugida!” – dizia-se. A filha é tirada de casa, levada ao motel e devolvida dignamente.
Namorar em casa, hoje, significa que os pais oferecem o quarto para as relações sexuais da filha. É melhor namorar em casa do que no motel, fica mais barato.
As relações entre homem e mulher andam tão democráticas, que fazer festa da família é complicado. Não aparecem apenas avós, filhos, noras, genros e netos. O ex, a ex, enteados, meio irmãos, todos se fazem presentes. Há sogras com quatro filhos e sete noras. Muitas crianças têm duas casas, a da mãe e a do pai. De repente, a criança atende o telefone e diz:
- Mãe, é o seu namorado!
Outro dia ouvi de uma criança a seguinte frase:
- Mãe, eu deixo você namorar o fulano.
Não estou inventando tudo isso, não se trata de hipérbole de cronista. Numa discussão respeitosa entre pai e mãe no processo de separação, o pai não queria se separar, insistia em continuar juntos, e o filho de quatro anos meteu o bedelho:
- Pai, arruma outra namorada, uai!
Antigamente, as mulheres cinqüentonas viravam bruxas diante da indissolubilidade do casamento, se tornavam mulheres amargas e feias num abandono branco de seus maridos. Hoje, abandonadas, elas são as verdadeiras balzaquianas e estão nos forrós, todas rejuvenescidas, indo à caça, dançando à noite toda, reconquistando a vida. O Viagra revolucionou as relações sexuais na terceira idade. Todas as mulheres são da vida, abandonaram a morte.
Há toda uma nomenclatura nova. Palavras mudaram de significado. Amigada já desapareceu. Namorado quer quiser que já está levando para cama. Amasso é coisinha de pré-adolescente, faz parte do ficar. Mas ficar também pode terminar no motel. Há casais maduros, ambos separados, morando cada um em seu apartamento, o cara é namorido.
Não estou lamentando, caro leitor! Só reclamo de ter nascido um pouco antes e ter perdido toda essa liberdade. Mas peguei a pílula anticoncepcional e o Viagra, não fui tão prejudicado.
Um comentário:
Seu cantinho é muito aconchegante e gostoso te ler
Parabéns.
Se me permitir continuarei te lendo.
Meu carinho.
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